Animais Fantásticos Os Segredos de Dumbledore

CRÍTICA: Os Segredos de Dumbledore é contido, mas cria expectativas para o futuro

Foi uma escolha ousada colocar o nome de Alvo Dumbledore, um dos personagens mais famosos de Harry Potter, como título do terceiro Animais Fantásticos. Mais ousado ainda foi sugerir que o filme revelaria seus “segredos”. É irônico, porém, que essa ousadia só exista no título – e isso não é necessariamente ruim.

Os Segredos de Dumbledore se passa alguns anos após seu antecessor, Os Crimes de Grindelwald. Os personagens seguiram suas vidas em uma suposta calmaria, mas quando o lado das trevas começa a se movimentar novamente, é sinal de que é preciso reunir novamente a equipe para impedir que Grindelwald (Mads Mikkelsen) ganhe mais influência no mundo bruxo. 

Muito menos afetado esteticamente do que Johnny Depp, que pediu demissão da franquia a pedido da Warner Bros., Mikkelsen entrega um personagem confiante, articulado e que parece ter ideais que vão além do poder e da tendência genocida, o que só o torna mais perigoso. Era boa a atuação de Depp, mas Mikkelsen está tão confortável e sedutor que faz parecer quase amadora a versão anterior do vilão.

Gerardo Grindelwald é interpretado por Mads Mikkelsen em Animais Fantáticos: Os Segredos de Dumbledore
Mads Mikkelsen interpreta Gerardo Grindelwald em Animais Fantásticos: Os Segredos de Dumbledore (Foto: Warner Bros. Pictures/Divulgação)

A relação de Grindelwald e Dumbledore (Jude Law) é certamente o ponto alto do filme, que já começa de uma forma agridoce, com a dupla discutindo num café o que os levou a lados tão opostos. É palpável o sentimento que existia – e ainda existe – entre eles, tomado por uma melancolia típica de um amor impossível que, aparentemente, não poupa nem bruxos poderosos.

Essa melancolia é muito presente em Dumbledore, que hesita em enfrentar uma pessoa tão importante de seu passado. Apesar de se mostrar mais uma pessoa de planos do que ações, ele se abre aos outros, principalmente a Newt, e com isso é possível entender melhor as aflições do personagem. Mesmo sem entregar nenhum spoiler, é preciso dizer que sua cena final é impactante e triste, muito pelo que acaba de acontecer e também pelo que acontecerá no fim.

A maior mudança de Os Segredos de Dumbledore em relação aos outros Animais Fantásticos é o roteiro. Os dois anteriores, assinados unicamente por J. K. Rowling, têm problemas básicos. É provavelmente por isso que este tem a adição de Steve Kloves, roteirista de todos os filmes de Harry Potter, menos o quinto. Kloves empresta sua experiência a Rowling para tornar a história mais fluida e resolver pontas soltas de Os Crimes de Grindelwald.

Basta reparar nos próprios animais fantásticos, que em geral têm agora uma função narrativa e não são mais apenas uma desculpa para cenas de ação. Eles são, ainda, beneficiados com um CGI que, mais escuro, faz com que se pareçam mais reais.

CRÍTICA: Os Segredos de Dumbledore é contido, mas cria expectativas para o futuro
Animais fantásticos têm função renovada em Os Segredos de Dumbledore (Foto: Warner Bros. Pictures/Divulgação)

Mas Kloves não faz milagres. As primeiras cenas de vários personagens são expositivas ao extremo, para garantir que o espectador que não se lembra ou não viu Os Crimes de Grindelwald saiba o que aconteceu. O amarrar da trama acaba não funcionando tão bem no caso de Queenie (Alison Sudol) e Credence; a primeira muda de ideia conforme é propício para a história, sem um bom desenvolvimento, e o segundo teve tantas reviravoltas em seu destino que, ao saber a verdade, ela… praticamente não importa nem causa impacto.

Este é o maior problema deste filme: para não correr risco de complicar as coisas, como fez seu antecessor, a decisão é não arriscar. A história de Dumbledore e Grindelwald se beneficiaria muito de flashbacks, por exemplo, mas eles não existem. Os “segredos”, por fim, só são segredos para quem não é fã da série. Também, muitos dos personagens parecem estar ali apenas para fazer a narrativa avançar, sem que os espectadores conheçam sua personalidade. De certa forma, isso beneficia o filme, por não haver risco de confusão com um grande número de tramas. Por outro lado, é o que o torna mais raso.

O próprio cenário político não vai muito além de uma comparação simples com a Alemanha nazista e o popularismo que há no fascismo. É difícil o espectador ter qualquer torcida na eleição que acontece se não se sabe nada sobre a campanha de ninguém. Maria Fernanda Cândido se mostra elegante como Vicência Santos, mas não tem espaço para mostrar nada além disso, nem mesmo quais são suas aspirações políticas e quais são suas diferenças com Grindelwald ou com o bruxo chinês, que são seus concorrentes.

A Ordem da Fênix e As Relíquias da Morte são exemplos de como Rowling é excelente ao criar metáforas políticas, mas, desta vez, ao enxugar da trama com Kloves, ela parece ter deixado de fora o que poderia ter sido o elemento mais interessante do filme.

CRÍTICA: Os Segredos de Dumbledore é contido, mas cria expectativas para o futuro
Ezra Miller e Jude Law são dirigidos por David Yates (Foto: Warner Bros. Pictures/Divulgação)

Os Segredos de Dumbledore é divertido em suas mais de duas horas de duração. Tem ótimas cenas de ação, um elenco bem entrosado e uma base interessante. Mas sua escolha de ser mais simples não o torna memorável como qualquer Harry Potter. Será difícil nos lembrarmos muito dele depois do primeiro impacto. 

Ele cria, no entanto, uma expectativa para os próximos filmes. A impressão é que, se Animais Fantásticos fosse uma trilogia, este prepararia muito bem o terreno para o último, direcionando o espectador com mais segurança para o “confronto final” e, por que não, abrindo espaço para uma participação maior de Maria Fernanda Cândido com Vicência Santos no futuro.

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Marina Anderi é bacharel em Cinema e Audiovisual pela Universidade Federal de Pernambuco.