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Jovem bruxo ultrapassa brincadeiras de criança

A crítica do The New York Times feita por Manohla Dargis também foi bastante favorável.

Assim como no livro “Harry Potter e o Cálice de Fogo” que deu origem à feliz adaptação, a infância termina com gritos e um calafrio final em um cemitério cheio de tumbas e de maldade. Em uma cena de impressionante intensidade, um menino morre enquanto outro é liberado da força malévola que veio se acercando de sua vítima durante a série de J. K. Rowling.

Ainda aproveitou para elogiar J.K. Rowling:

Como os leitores mais ávidos sabem, a genialidade dos livros está tanto na identidade dupla de Harry quanto no domínio de Rowling do mundo fantástico. Harry é ao mesmo tempo uma pessoa suscetível e um total estranho, ao mesmo tempo mal ajustado e extraordinariamente legal. Ele serve de espelho para os que se atracam com os livros ou se congregam nos cinemas, voando na imaginação.

O texto completo por ser lido aqui.

Jovem bruxo ultrapassa brincadeiras de criança
“Harry Potter e o Cálice de Fogo” mantém o encantamento da série

A infância termina para Harry Potter, o jovem bruxo com a cicatriz em zigue-zague e um mundo fantasmagórico de problemas, pouco depois dos dragões rugirem e o povo das sereias gritarem suas ameaças vazias por dentes quebrados.

Assim como no livro “Harry Potter e o Cálice de Fogo” que deu origem à feliz adaptação, a infância termina com gritos e um calafrio final em um cemitério cheio de tumbas e de maldade. Em uma cena de impressionante intensidade, um menino morre enquanto outro é liberado da força malévola que veio se acercando de sua vítima durante a série de J. K. Rowling.

Esta é a segunda vez que Harry (Daniel Radcliffe), hoje com 14 anos, vivencia o fim da infância, como nos lembram Rowling e os diretores de todos os quatro filmes. Órfão com um ano de idade pelas mãos do bruxo do mal Lorde Voldemort, Harry veio se desenvolvendo com os anos, livros e filmes.

De uma figura sentimental de Dickens, ele se tornou um adolescente irritadiço, para quem as meninas agora são um problema quase tão sério quanto o senhor das trevas. Como os leitores mais ávidos sabem, a genialidade dos livros está tanto na identidade dupla de Harry quanto no domínio de Rowling do mundo fantástico. Harry é ao mesmo tempo uma pessoa suscetível e um total estranho, ao mesmo tempo mal ajustado e extraordinariamente legal. Ele serve de espelho para os que se atracam com os livros ou se congregam nos cinemas, voando na imaginação.

Como no último filme, “Harry Potter e o Prisioneiro de Azkaban”, o mais recente começa e termina com uma nota sinistra. Em “Azkaban”, um passarinho é atacado por uma árvore gigante tanto no início quanto no fim; em “Cálice de Fogo”, são pessoas que apanham. Essas pobres criaturas não estão no livro, mas inteligentemente delimitam “Azkaban”, preparando o público para a história mais assustadora, medonha e séria que se segue, assim como para os capítulos mais sombrios adiante.

Se o mundo dos dois primeiros episódios, “Harry Potter e a Pedra Filosofal” e “Harry Potter e a Câmara Secreta”, ambos dirigidos pelo agressivamente otimista Chris Columbus, representava algum tipo de paraíso para o menino bruxo, este paraíso logo será perdido.

A cobra escorregadia e o zelador tremendo que abrem “O Cálice de Fogo” deixam claro que a classificação do filme passou de “livre” para “maiores de 14 anos”. Como seu predecessor, Alfonso Cuarón, que trouxe nova beleza e profundidade à série, o diretor Mike Newell abraça o lado negro da saga com elegância.

Desta vez, a história gira em torno do Torneio Tribruxo, uma competição que leva Harry a arriscar a vida contra três jovens competidores e uma série de inimigos mais ameaçadores. Entre os feitos corajosos com dragões, há flertes no refeitório, brigas de colegiais e um bando de jovens visitantes que, em princípio, parecem inocentes, mas se tornam a Femme Nikita. Há também as dores de crescimento naturais e muita angústia adolescente.

Agora com 16 anos, Radcliffe já faz cara de raiva razoavelmente bem, mas ainda precisa desenvolver a habilidade de passar emoção junto com a cara. Isso pode vir a ser um sério obstáculo para os filmes, mas ainda não, em parte pela graça de acompanhar seu crescimento na tela junto com seus co-atores –o excelente Rubert Grint como Ron e a comoventemente séria Emma Watson como Hermione.

O cinema não apenas imortaliza os atores, trancando-os na juventude, mas também solicita nosso amor de uma forma diferente dos livros, já que nos entregamos não apenas aos personagens, mas também aos atores. Radcliffe não é um rei da atuação, mas ainda assim torcemos por ele, em parte porque queremos que Harry triunfe e em parte porque há algo de pungente na luta desse ator e seu personagem.

Se, por um lado, a principal atração continua hesitante, por outro, um dos constantes prazeres dos filmes –e uma das vantagens do poder de Hollywood por trás deles– tem sido seu elenco de pedigree. Entre os cavaleiros e damas britânicos e canastrões de qualidade voltando à série estão Michael Gambon, Alan Rickman, Robbie Coltrane, Maggie Smith, Timothy Spall e Gary Oldman, cuja breve aparição infelizmente não passa de um tira-gosto.

Miranda Richardson aparece como Rita Skeeter, uma jornalista enxerida que serve para nos lembrar que Harry não é mais criança. Brendan Gleeson é o mais novo professor de Hogwarts, Olho Tonto Moody, um homem tagarela com partes removíveis, inclusive um olho móvel que ele usa como um tapa-olho de pirata.

Esses atores são excelentes, mas nada nos prepara para a força malévola que é Lorde Voldemort e o brilho do ator que o interpreta, Ralph Fiennes. Com vestes negras que parecem flutuar acima de seu corpo, em vez de caírem, Fiennes se move com graça e flexibilidade, sua cabeça branca bóia como uma rolha no mar, suas mãos flutuantes e pés pálidos brilham como faróis.

Por anos, os filmes tentaram transformar esse ator de beleza delicada em galã, mas como provou “A Lista de Schindler”, um passeio nas trevas para Fiennes não é apenas um prazer, mas uma liberação. Seu Voldemort talvez seja a melhor atuação de uma pessoa sem nariz; certamente, é uma sublime encarnação de vilão.

Fiennes entra no filme espetacularmente, apesar de tarde. Ele adentra o cemitério como um dançarino de Butô do inferno, levando o filme a um fim desconcertante, que não completa a história, mas dilacera-a. Isso é pelo bem do filme e da série, já que cada história tem que se fechar em si mesma e ao mesmo tempo nos preparar para a próxima.

Se Cuarón elevou a série para um novo nível com “Azkaban”, Newell, mais conhecido por “Quatro Casamentos e um Funeral” e famoso por “Donnie Brasco”, consegue manter sua contribuição em um nível de encantamento igualmente alto. Seu lado sombrio talvez seja menos poético, mas a combinação de excentricidade britânica, fatalismo e tensão continua irresistivelmente intacta.

“Harry Potter e o Cálice de Fogo” é recomendado para maiores de 14 anos. Mais violento que os três primeiros filmes, este capítulo inclui duas mortes, inclusive a de um adolescente.

Tradução: Deborah Weinberg