J. K. Rowling

TRADUZIDO: J.K. Rowling fala sobre sua vida, carreira e muito mais em nova entrevista

A edição mais recente da revista Weekend, do jornal The Guardian, trouxe J.K. Rowling em sua capa anunciando uma matéria especial com entrevistas de diversas personalidades como Jo Rowling, Edward Snowden, Lauren Laverne e Brian Eno.

Com o objetivo de mostrar como a arte da conversação está morrendo, a matéria trouxe diversas conversas casuais sobre a vida e carreira dos entrevistados e com J.K. Rowling não foi diferente.

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“Eu sou uma pessoa de grupos pequenos. Meu sonho é um pequeno grupo que conheço muito bem, aí podemos ter conversas intensas. Não quero uma briga, mas quero uma conversa sobre coisas que realmente importa.”

A autora falou muito sobre sua carreira, sobre como está lidando com a fama e o quão sua vida mudou desde o sucesso da publicação do primeiro livro de “Harry Potter”. Ela também não apenas falou sobre Robert Galbraith, como deu um pequeno detalhe do que o quarto livro do autor trará como um dos temas e comentou o quão está feliz com os projetos de “Harry Porter and the Cursed Child” e “Animais Fantásticos e Onde Habitam”.

Ela também falou sobre sua vida e disse entender os fãs e o impacto que causa neles, citando o exemplo de quando encontrou seu maior ídolo, Morrissey, o líder e cantor da banda The Smiths.

Hoje (28), em seu Twitter, a autora comentou que a entrevista com a apresentadora Lauren Laverne foi uma das mais divertidas que teve em sua carreira.

A equipe do Potterish tratou de traduzir a entrevista completa e na íntegra que foi publicada no site do The Guardian. A tradução do bate-papo você confere no modo notícia completa, assim como a capa da revista e todas as outras fotos que ilustram o encontro entre de Jo Rowling e Laverne.

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J.K. Rowling encontra Lauren Laverne: “O sucesso nunca é da maneira que você espera”
Weekend – The Guardian
28 de novembro de 2015.
Traduzido por: Marina Anderi e Pedro Martins em 28/11/2015.
Revisado por: Donizete Junior em 28/11/2015.

J.K. Rowling é a autora de 15 livros, incluindo os 7 de Harry Potter, Morte Súbita e, como Robert Galbraith, três romances policiais. Seu primeiro roteiro, para “Animais Fantásticos e Onde Habitam”, está atualmente em produção; ela também está colaborando numa nova peça, “Harry Potter And The Cursed Child”, que, mostrando Harry como um adulto pai de três filhos, estreia em Londres em junho do ano que vem. Lauren Laverne era a vocalista de Kenickie e é uma comentarista de rádio e TV, atualmente apresentando o programa matinal BBB 6 Music. Ela também é co-fundadora e diretora de transmissão do site The Pool.

Rowling e Laverne se encontram num dia cinzento no leste de Londres, Laverne em seu tempo livre entre seu programa de rádio e uma premiação, Rowling vindo de táxi do oeste de Londres (ela não dirige). É a primeira vez que se conhecem, embora já tenham gostado uma da outra no Twitter, onde Rowling tem quase seis milhões de seguidores e Laverne tem 380 mil. Rowling quer conhecer Laverne porque, ela diz, “ela é inteligente, engraçada, meu tipo de mulher” (e um nome para impressionar sua filha de 22 anos, Jess). Laverne, enquanto isso, está aprofundada nos anos Harry Potter, com um filho de 8 e outro de 5 anos. As duas mulheres se dão bem logo de cara, Laverne com aquele talento de DJ para preencher o silêncio, enquanto Rowling – mais tímida, menos confortável com a câmera – ri e vai ficando mais audível e se mantém assim. Ela compartilha uma foto de celular do filho de 12 anos, e se recorda da única sessão de fotos que realmente desfrutou (aquela em que Annie Leibovitz tirou toda sua maquiagem e tirou uma foto dela segurando um livro em chamas, “e eu amo fogo”). Elas podiam ter continuado, mas aqui vai o que conseguimos…

Lauren Laverne [LL]: OK, vamos conversar. Então aparentemente isso é parte de uma série sobre como a arte de conversar está morrendo. E não tenho certeza se somos um caso-teste ou…

J.K. Rowling [JKR]: Vamos provar que estão errados!

LL: Mas pensei em perguntar que tipos de conversas você mais gosta – com quem você gosta mais de conversar?

JKR: Bem, é muito meloso, mas meu marido é definitivamente meu melhor amigo. Minha irmã. Eu sou uma pessoa de grupos pequenos. Meu sonho é um pequeno grupo que conheço muito bem, aí podemos ter conversas intensas. Não quero uma briga, mas quero uma conversa sobre coisas que realmente importa.

LL: Sou terrível em jogar conversa fora.

JKR: Não acho que eu consiga ser amiga de alguém que fosse bom em jogar conversa fora.

LL: Lembro-me de uma vez ter que conversar com um membro do parlamento. Era um programa de TV bem à noite e a pessoa trouxe os jornais do dia seguinte para dar uma olhada, e tinha a foto de um cachorro na primeira página. E você sabe aquele modo saudoso em que pessoas finas falam sobre animais? É uma das coisas que nunca aprendi. Eu não sei que cara fazer. Também sobre qualquer coisa onde pessoas falam sobre o caminham que tomaram para chegar aqui.

JKR: Bem, eu não dirijo, então sou pior ainda. Outra pessoa me trouxe pra cá, e estou sempre pensando em outra coisa no caminho.

LL: Minhas amigas e eu temos um encontro trimestral, porque é muito difícil juntar todo mundo. Mas temos esse encontro trimestral onde saímos e nos sentamos, e quase levantamos nossa mangas, porque temos que falar de tudo.

JKR: Duas das minhas amigas mais próximas vivem no exterior, então somos assim. Você quase tem que ter uma agenda: temos que falar de tais tópicos.

LL: Nós definitivamente discutimos antes o que vamos discutir. Falamos isso como uma piada, mas essas são as conversas que deixam tudo certo. Eu também falo com minha mãe o tempo todo. Recentemente discutimos menopausa. Ela disse que não era tão ruim, e que na verdade enquanto você envelhece seus níveis de testosterona aumentam.

JKR: Você não está nem um pouco perto da menopausa!

LL: Não, mas acho que ela está nos preparando.

JKR: Eu não tenho muita ideia disso porque, sem querer acabar com o humor dramaticamente, minha mãe morreu antes de atingir a menopausa. Preciso forçar minhas amigas a falar comigo sobre isso.

LL: Minha mãe começou falando que, enquanto você envelhece, você vai aguentando menos e menos merda. E estive escrevendo recentemente sobre olhar pros 40. Tenho 37 anos, e quero decidir como abordá-los.

JKR: Eu genuinamente amei fazer 40. Veja, eu não era muito boa em ser jovem. Sinto que fui ficando mais e mais feliz. Sinto que estou alcançando minha idade correta.

LL: Sempre fui uma alma velha.

JKR: Posso ver isso em você – mas ainda acho que você era melhor em ser jovem do que eu.

LL: Ah, não sei. O hedonismo desenfreado nunca foi muito bem adequado a nós, na verdade. Estou ansiosa para meus 40, aí vou saber onde estou. Mas é uma época maravilhosa, especialmente com as crianças.

JKR: Não vou perguntar se você vai ter mais [crianças], porque acho que essa é uma pergunta incrivelmente invasiva. Mas vou te contar, eu teria tido mais se fosse mais jovem.

LL: Sério?

JKR: Sim, definitivamente. Mas eu tinha 39 anos quando tive meu mais novo, então decidi traçar um limite. Senti que fomos muitos sortudos, tivemos três crianças maravilhosas, então parei. Mas eu nunca ia chegar num ponto em que pensaria “nunca mais”.

LL: Eu não consigo imaginar eu mesma chegando a esse ponto. Minha atitude sobre o assunto sempre foi que a alegria está no desconhecido. Toda a experiência de ter filhos é sobre sua perda de controle – você não tem como escolher quem eles são.

JKR: Exatamente.

TRADUZIDO: J.K. Rowling fala sobre sua vida, carreira e muito mais em nova entrevista

LL: Eu queria te perguntar sobre nomear coisas, porque você tem um relacionamento interessante com o poder dos nomes. Obviamente, tendo escrito com diferentes pseudônimos, e tendo personagens com esses maravilhosos, Dickenianos, com nomes perfeitamente apropriados.

JKR: Acho que estavam apostando chance de 100 pra 1 que eu chamaria meu filho de Voldemort. 100 em 1! Valia uma aposta. Mas você está certa, nomes são muito importantes. Escolher o pseudônimo Robert Galbraith foi uma grande coisa.

LL: Como você fez isso?

JKR: Bem, quando eu era criança eu queria me chamar Ella Galbraith. Então pensei que poderia ser LA Galbraith, mas aí não queria usar iniciais.

LL: Seria muito óbvio.

JKR: Sim, e realmente não tinha pensado muito nisso – existe também JK Galbraith, o famoso economista. Foi só depois que escolhi Robert, por causa de Robert Kennedy, que é meu politico herói dos heróis, que pensei, “é como se eu quisesse ser pega! O que estou fazendo?”

LL: Não há acidentes.

JKR: Mas até lá eu já tinha enviado manuscritos para um monte de editoras. E havia uma pequena empresa que queria publicar Robert, Deus os abençoe. Mas até lá a Little, Brown já estava interessada, então… E seria um segredo grande demais para pedir para uma pequena editora guardar.

LL: Consegue imaginar, o dia que você entrou nessa?

JKR: Estava se tornando progressivamente problemático, mas eu tinha esse sonho de conseguir lançar dois ou três livros antes de ser descoberta.

LL: Fico me perguntando se o nome te permitiu escrever como o personagem, ser ele.

JKR: Você quer dizer escolher um pseudônimo masculino? Sinto-me sem gênero enquanto escrevo. Gênero não me usurpa de forma alguma. Mas foi uma grande libertação, pensar, “Ninguém vai saber que sou eu.” Fiquei tão animada com cada carta de rejeição, você não tem ideia. Teve um editor que disse, “Olha, nós gostamos muito disso, mas acabamos de fechar com outro cara que está trabalhando na mesma área geográfica.” – e fiquei encantada. Não vou dizer que fiquei tão animada quanto qualquer iniciante ficaria, porque não é a mesma coisa. Qualquer autor de primeira viagem ficaria bem mal: “Você gostou – e você não vai publicar!” Eu só estava, “Você gostou! Isso é ótimo!” Queria que isso tivesse durado mais tempo.

LL: Mas você não teve 12 rejeições para Harry Potter?

JKR: Sabe, li todo tipo de número e não sei de verdade. Mas foram várias, sim.

LL: E eles machucaram mais? O que te fez seguir em frente?

JKR: [Longa pausa] Essa é uma ótima pergunta porque eu sei que na época eu não estava nem um pouco confiante. Mas eu queria tanto, eu não ia desistir. E não acho que algum dia senti, antes ou desde então, nada como a exaltação de perceber que eu seria publicada.

LL: Como você descobriu?

JKR: Meu agente me ligou e… ele estava tão calmo! Uma editora tinha ficado com o manuscrito por seis meses, o que obviamente me encheu de esperança, e então disse não. Fiquei devastada. Então [meu agente] me ligou e disse, “Bem, a Bloomsbury quer” – muito casual! Sem perceber que estava me dando o presente da minha vida. E teve essa longa pausa, e eu só disse: “Então… você está dizendo que serei publicada?” Eu estava fora de mim.

LL: Terrível momento Pete Best* para quem te recusou.
(N/T: Pete Best foi baterista dos Beatles antes de Ringo Star assumir)

JKR: O engraçado é que a primeira editora a rejeitar Harry Potter escreveu para Robert [Galbraith] sua mais rude rejeição. Então acho que é seguro dizer que nunca vou escrever para eles. Eles claramente não gostam de mim, em qualquer forma que eu me apresente. [Risos]

LL: Ainda é não, OK? Se toca, Rowling!

JKR: Nós não queremos a droga da sua poesia!

LL: Mas foi só uma questão de: você acreditava tanto [em Harry Potter].

JKR: Sabe, posso dizer isso agora, fui muito hesitante em dizer isso por muito tempo. Mas eu acreditava, com Harry, que a parte difícil seria persuadir alguém a publicar, porque não se encaixava. Pessoas diziam que livros infantis tinham que ter metade do número de páginas, e que assunto mais datado, um internato. Eu tinha a impressão de que o difícil seria persuadir alguém a publicar – mas que se fosse publicado, as pessoas gostariam.

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LL: Perguntei-me como você media sucesso. Li sua página no Wikipedia porque íamos fazer isso…

JKR: Oh Deus, você leu? Eu nunca li. Li a sua.

LL: Você fez muito bem, Jo.

JKR: Saúde, Lauren!

LL: Sem spoilers, mas até onde todas as métricas tradicionais vão, você está arrasando pra caralho.

JKR: [Risos] LL Mas uma vez que você tem a  Légion d’honneur, como se mede [o sucesso]?

JKR: É muito estranho você estar me perguntando isso, porque há quatro dias escrevi a resposta no quarto livro de Robert Galbraith. Porque quando você encontra meu detective no quarto livro, ele está refletindo sobre como o sucesso nunca dá a sensação que você imagina que daria. Algumas pessoas assumiriam que você está sentada por aí se sentindo simplesmente maravilhosa e lustrando suas bugigangas. Mas eu me lembro, uma semana após conseguir meu contrato americano, o que me gerou um monte de publicidade, de uma das minhas melhores amigas me ligar e dizer, “Achei que você soaria tão exultante.” Do lado de fora, tenho certeza que tudo parecia maravilhoso. Mas no meu apartamento, onde ainda era uma mãe solteira e não sabia quem chamar para fazer meu cabelo, tudo parecia fenomenalmente esmagador. Pela primeira vez na minha vida eu podia comprar uma casa, o que significava segurança para mim e minha filha, mas agora eu sentia: “O próximo livro não pode possivelmente se igualar a isso.” Então eu consegui transformar esse triunfo maravilhoso em tragédia, no espaço quase cinco dias.

LL: Penso nisso como a “Síndrome de Casa Grande”, o que me assusta levemente. Porque muitos dos meus contemporâneos foram e fizeram coisas maravilhosas, e penso em mim mesma seguindo em frente, levemente abaixo do radar, mas consistente, sabe? Sou como um meio-termo: permanece no trabalho, mantém sua cabeça abaixada. A coisa assustadora do sucesso é que você tem que continuar fazendo-o – e você não sabe como você o fez em primeiro lugar.

JKR: Você fez algo que parecia natural, e aí você é colocada numa posição que parece muito antinatural. Você está tentando se reconectar com aquela coisa que parecia normal há cinco minutos.

LL: É: agora faça de novo! Mas a lenda de Harry Potter chegou para você como um tipo de universo, na sua totalidade.

JKR: Há verdade nisso. Foi como uma explosão de cor, e eu podia ver muitos detalhes sobre o mundo. Claro que o enredo inteiro de sete livros não veio de uma vez, mas as premissas básicas estavam lá.

LL: E quantos desses mundos você consegue manter na sua cabeça ao mesmo tempo?

JKR: Acho que provavelmente estou no meu nível máximo agora. Há uma peça, que será incrível. Posso dizer que estou colaborando com Jack Thorne e John Tifanny na história, o que tem sido indecentemente divertido. Dei a eles um monte de material que tinha e trabalhamos juntos – mas será uma experiência teatral e isso não tem nada a ver comigo, essa a área de John.

LL: E sobre roteirização? Foi sua primeira vez?

JKR: Eu sempre soube que Warner Bros. queria fazer algo com Animais Fantásticos e, sendo levemente louca por controle, achei melhor contar a eles que tinha uma ideia. Então meio que escrevi o roteiro sem querer. Sei que isso soa incrivelmente insincero.

LL: Meio como Withnail indo de férias por engano.

JKR: Bem, como você diz, não há acidentes. Mas eu estava fazendo aquela coisa fatal de pensar, “Bem, fico imaginando como seria.” Foi algo bem superficial. Mas aqui estamos nós, e agora escrevi direito. Tem sido uma linha de aprendizado virtualmente vertical.

LL: Meu fato favorito de Harry Potter é que uma universidade italiana fez crianças lerem os livros e então mediram seus níveis de empatia e descobriram que ler os tornava empáticos.

JKR: Eu li isso.

LL: Eu sabia que você teria lido e eu sabia que você amaria.

JKR: Claro que amo! Quem não amaria? Eu estava saindo com um grupo de amigos outra noite e um deles falou pra mim, “Esse livro ainda significa tanto para esse pessoal de 20 anos!” E eu disse que realmente entendia, porque sei o quão significou pra mim conhecer Morrissey.

LL: Você era uma grande fã dos Smiths.

JKR: Grande fã dos Smiths. E as pessoas que significam algo pra você aos 16, 17 anos, são as pessoas que estão te ajudando a passar pelas coisas. Portanto entendo absolutamente por que alguém que está usando Harry Potter como refúgio aos 13 anos está animado aos 21 para falar sobre qual casa [de Hogwarts] estaria. Não acho que é infantil. Não acho que é mais infantil do que eu ficando animada para conhecer Morrissey. Eu estava com minha cunhada e ela disse, “Abaixe. Sua. Mão.” Eu estava andando por aí depois com minha mão assim [faz mímica de um rígido aperto de mão].

LL: Como um Dalek.

JKR: Eu disse, “Morrissey me tocou!” Ela disse, “Eu sei, você parece estúpida.” Eu o conheci numa situação tão bizarra, em Harvey Nichols. Nós estávamos olhando um para o outro, ficando mais e mais perto, e quase exatamente ao mesmo tempo nós esticamos nossas mãos. O maravilhoso para mim era que Morrissey sabia quem eu era. Eu queria voltar para o meu deu de 16 anos, que está deitada no escuro com um incenso, ouvindo “Heaven Knows I’m Miserable Now”, e contar pra ela: “Você vai conhecê-lo! Ele vai saber quem você é!”

LL: Eu queria te perguntar sobre dinheiro, porque toda vez que mulheres conversam sobre dinheiro, um anjo ganha suas asas. Eu queria perguntar sobre o que você aprendeu sobre ele durante os anos, não tendo nenhum, aí tendo um monte, aí doando muito – aparentemente você saiu da lista dos ricos da Forbes por ter doado tanto.

JKR: Sim, saí. Penso que tive a experiência mais peculiar porque já estive em todo nível financeiro que se pode estar, sabe, de estar completamente dura. Minha família não tinha muito dinheiro, mas não faltava nada. Acho que o nível que perdi, o em que provavelmente fiquei rapidamente por duas semanas, foi de vida confortável de classe média. Eu pulei esse.

LL: O trem não está parando, o Expresso de Hogwarts está passando!

JKR: Eu estava num lugar em que pensava, “OK, se eu continuar trabalhando, ficaremos bem, estamos seguros,” quando de repente, bang! E pensei, “Eu não esperava isso,” foi como se eu tivesse passado da marca. E essa é uma coisa difícil de dizer às pessoas, porque você pode ouvir milhões querendo te matar por dizer isso, o que de alguma maneira dá medo. Mas foi muito assustador.

LL: Você não achou que seria capaz de lidar?

JKR: Eu não sabia o que deveria fazer com o dinheiro. Eu não conhecia ninguém que tinha passado por isso. Um dos motivos pelos quais eu queria muito conhecer Oprah Winfrey…

LL: [No gravador] Oprah não estava disponível hoje.

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JKR: [Risos] Eu gostei muito de ser entrevistada por ela porque fomos capazes de ter essa conversa. Ela foi alguém que não cresceu rica, então de repente teve dinheiro e ninguém para conversar – e você não conhece muitas mulheres nessa posição. Ela falou para mim, “Você aceitou que vai ser sempre rica?” e eu definitivamente não aceitei. E eu disse a ela, “Você aceitou?” e ela disse, “Sim, eu sei que serei rica para sempre.” Isso ainda não desceu. Quanto eu estava grávida de meu filho, eu passei por uma real preocupação com dinheiro que era completamente irracional e acho que isso estava relacionado com estresse – eu estava lançando um livro e tinha um bebê a caminho. Acho que era um flashback da última vez que eu estava grávida, quanto eu era muito pobre. Eu me reconectei com meu eu da vez que estava em pânico porque não teria como vestir o bebê.

LL: Meu pai é um acadêmico e minha mãe estava ensinando em faculdade quando eu era pequena; eles são de origens bem humildes – ela não consegue ter um armário vazio, apenas a faz lembrar. Meu pai não consegue jogar nada fora.

JKR: Eu realmente me identifico com isso. Odeio não ter dinheiro em espécie comigo, e isso definitivamente é uma conexão com ter recebido dinheiro do governo e, sabe, simplesmente ver meu dinheiro diminuir durante a semana e rezar para que durasse.

LL: Meu pai chama de “andar ao redor de dinheiro”. O que é interessante sobre isso é que, você tem esse tema correndo por todo o seu trabalho de vantagem e desvantagem, e a natureza cumulativa dessas coisas.

JKR: Verdade. E é algo pelo qual eu tenho um sentimento muito forte. Conheci um homem há uns dois anos que tinha crescido com uma grande quantia de dinheiro. E ele falou pra mim de passagem, “Sabe, dinheiro não é a coisa mais importante.” O que é tanto verdade quanto profundamente ignorante. Porque quando você não tem nenhum dinheiro, isto é absolutamente a coisa mais importante. Só alguém que nunca teve que se preocupar consegue falar algo assim.

LL: Você acha que é o mesmo com a fama? Parece uma coisa nebulosa, mas volta ao poder dos nomes. Você dá seu nome a algo, seu apoio, e isso realmente importa.

LL: E sobre ser reconhecida? O disfarce que tenho usado é que todas as locutoras da BBC se parecem bastante. Então seria “Você é Jo Whilley?”. Mas percebo que você diz “Desde quando Harry ficou famoso” e não “Desde que eu fiquei famosa”.

JKR: Eu tive uma relação verdadeiramente desconfortável com isso por muito tempo. Por anos, minha imaginação foi que, um dia, eu iria entregar o meu cartão de crédito em uma loja e eles diriam “Nossa, você escreveu meu livro favorito!”. Eu imaginava que você apenas precisava ter uma vida bem privada e sossegada. Não esperava que fosse ser fotografada furtivamente em um maiô.

LL: E, sendo uma mulher, suas opiniões podem chatear algumas pessoas.

JKR: Exatamente. Mas você aprende, não?

LL: Se você não a ama, não corre atrás dela, as pessoas ficam ligeiramente desconfiadas. Existe uma presunção cultural de que [a fama] é tudo, a apoteose do sucesso.

JKR: Lisa Kudrow, de “Friends”, disse que “Você imagina ela como um abraço, mas, quando acontece, parece um assalto”. Eu me lembro da primeira vez que sai do carro em um evento de tapete vermelho – achei assustadora aquela muralha de gritos. Não senti aquilo como um banho quente de amor. Não é que eu não me sinta incrivelmente calorosa em relação as pessoas fazendo aquele barulho, porque eu me sinto, mas no geral foi assustador.

LL: E se escrever é o que você ama, isso lhe afasta.

JKR: Se você quer ser uma autora, é provável que você seja uma pessoa bastante introvertida, que particularmente não quer se preocupar com a aparência de tudo isso. E a fama, na sua encarnação moderna, demanda muito uma mentalidade bem contrária disso.

LL: Mas o Twitter é bem confortável para você, evidentemente.

JKR: Você está nadando no seu próprio ambiente. Para mim, o Twitter têm sido uma dádiva total, incluindo os trolls. Chegou um momento em que Harry se tornou tão grande que, em uma leitura para o público, havia duas mil pessoas. Você não consegue responder às perguntas de todos. O Twitter me deu isso de volta. Ninguém precisa comprar um ingresso. É bem democrático.

LL: Há uma frase adorável no seu website, o Pottermore: “seu canto mágico da internet”. Se você estivesse no comando, iria expulsar os trolls?

JKR: As minhas listas de pessoas bloqueadas e silenciadas não são longas, pois eu tenho uma tolerância muito alta para aqueles que não necessariamente preciso ser amiga – estou interessada no que eles estão dizendo. Você não gostaria de higienizar a sua timeline até chegar um ponto em que não veria alguns desses personagens. Vamos chamá-los de personagens. Quando você começou a tuítar?

LL: Perto de 2009. Gostei bastante daquilo. Porque tenho essa coisa, bem parecida com você, que sou realmente amigável, mas bem privada. Ainda acho isso criativo e interessante. Suponho que não deveria. Às vezes, acho que não me importo com as coisas que deveria me importar.

JKR: A vida é muito curta. Realmente é, não? Quando você está na década dos 20 anos, essas coisas significam muito mais, mas não sei. Eu me desprendi bastante.

LL: Eu estava me perguntando se você gosta de rádio.

JKR: Eu amo rádio.

LL: Mas você seria ótima na rádio!

JKR: Bem, é a minha mídia favorita.

LL: É a mídia favorita de todas as melhores pessoas. Acho que o especial do rádio é ele ser muito profundo, mas de forma extremamente comum. Você é devidamente uma parte da vida diária das pessoas, tem as pessoas nascendo, envelhecendo, morrendo, passando por coisas difíceis em suas vidas, e você pode acompanhar elas.

JKR: Na verdade, eu sempre escuto à Radio 3 quando estou trabalhando, porque acho a voz humana bem divagante.

LL: Sim, se estou sentada no escritório do Pool, o nosso site, eu sempre escuto um pouco de Steve Reich. E eu também tenho uma coisa estranha: sei todas as letras antes de ouvi-las pela primeira vez. Quando estou entrevistando alguém, terei as músicas dele tocando repetidamente na minha cabeça. O pior foi quando filmei o especial de natal do “Ant and Dec” em um barco em Newcastle. Ficamos acordados bebendo até as 7h da manhã, foi hilário e brilhante, mas o tempo todo eu fiquei com “Let’s Get Ready To Rhumble” tocando sem parar na minha cabeça.

JKR: Essa está em toda coleção de uma certa época.

LL: Ela é subestimada.

JKR: Não é, não.

LL: Se as pessoas olhassem no meu iPhone, veriam que não há nada remotamente legal. Nunca me preocupei sobre essas coisas.

JKR: Eu verdadeiramente te vejo como alguém muito mais legal do que eu.

LL: Você está brincando comigo?

JKR: Você definitivamente é. E isso foi divertido.

LL: Foi muito divertido.