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A busca pela identidade no conto A Fonte da Sorte

Os contos de Beedle, o Bardo, foram lançados há algum tempo, já após o fim da série, constituídos num único livro. Eles são, segundo o que se diz em Harry Potter e as Relíquias da Morte, os contos de fadas do mundo bruxo.

Nossa colunista Natallie Alcantara traz neste domingo uma coluna especial, sobre o conto “A fonte da sorte”, fazendo uma análise aprofundada sobre o objetivo do conto e a forma como chega aos leitores. Leia a coluna de Natallie e reflita sobre a moral da história!

Por Natallie Alcantara

OS CONTOS DE BEEDLE, O BARDO

Os contos de Beedle, o bardo, é um livro infantil bruxo, que contém cinco pequenas histórias, os contos de fadas dos bruxos. Foram escritos por um bruxo no século XV e traduzidos das runas originais por Hermione Granger, com comentários e notas pessoais de Alvo Dumbledore, antigo diretor de Hogwarts.

A FONTE DA SORTE

“A fonte da sorte” narra como três bruxas e um cavaleiro desafortunados conseguem chegar a um jardim encantado, onde se encontra a Fonte da Sorte, de cuja água aquele que beber será favorecido eternamente pela fortuna e boa sorte. Asha tem uma doença incurável; Altheda foi roubada e humilhada por um feiticeiro; Amata teve o coração partido por alguém que amava. Quando a passagem para o jardim se abre, as três bruxas resolvem entrar juntas, mas Amata sem querer acaba levando o cavaleiro junto.

Durante o percurso, são lhes apresentados três desafios. Uma minhoca monstruosa quer como pagamento para lhes deixar passar uma “prova de sua dor”. Após tentarem atacá-la com magia, as lágrimas de frustração de Asha satisfazem a criatura. A seguir, eles se encontram em uma encosta que exige como pagamento o “fruto de seu trabalho”. Após muito andarem, o suor do rosto deles pela caminhada permite-lhes continuar. Um riacho no caminho exige o “tesouro do seu passado”. Amata usa sua varinha para retirar suas lembranças sobre seu amor perdido e as atira na água, permitindo-lhes chegar a fonte.

No entanto, Asha já não aguenta mais e afirma que não vai prosseguir com eles, insistindo para eles a deixarem. Altheda faz uma poção, que cura Asha. Sem precisar mais da Fonte, esta cede o lugar para Altheda, que percebe que poderia ganhar dinheiro curando os outros. Ela então cede o lugar para Amata, mas a bruxa, após deixar no riacho suas lembranças dolorosas, percebe que não precisa mais da fonte. Ela cede lugar ao cavaleiro, que aceita e pede a mão de Amata. Assim, todos acabam alcançando seus próprios objetivos, sem desconfiar que, na verdade, a fonte não possui poder mágico algum.

A busca pela identidade no conto A fonte da sorte

A fonte da sorte faz parte da coletânea de contos lançada no livro Os contos de Beedle, o bardo. Esse livro, considerado os contos de fadas do mundo bruxo, traz com ele, como os contos de fadas trouxas, lições importantes que ajudam a definir o ser humano. De acordo com um estudioso deste gênero, Bettelheim, os contos de fadas aludem às experiências humanas a fim de que o leitor aprenda sobre a vida real.

No conto A fonte da sorte, cada um dos personagens parte em busca de algo diferente: saúde, riqueza, esquecimento. Dos três objetivos, talvez se pudesse afirmar que o único indispensável ao ser humano seria a saúde. No entanto, sabe-se que não se vive sem uma porção de riqueza considerável a seu sustento e que o esquecimento em si pode sim ser uma dádiva. Através dessas buscas, as três bruxas acabaram se tornando representações de indivíduos em formação.

A busca dos personagens faz com que o leitor também deseje acompanhar e alcançar seus objetivos. Assim, a história acaba incutindo no leitor uma ideia de formação de identidade: a ideia de que ser um indivíduo capaz de abandonar tudo que lhe fez mal; de adquirir a riqueza que for através do trabalho honesto; e de procurar dentro de si uma vontade impulsionadora de mudar a própria sorte.

Deve-se ressaltar que, embora o livro seja tido como contos de fadas, voltado ao público infantil, ele foge um pouco desta característica do gênero: apresentar em suas histórias personagens infantis. Em todo o livro, os personagens são adultos. No entanto, continua sendo fácil para o leitor, mesmo o jovem, se identificar com algum personagem, pois a lição a ser apreendida vale para qualquer um.

Durante o percurso até a fonte, os viajantes se deparam com três obstáculos, cada um cobra um preço para que o caminho seja liberado. Primeiro, é exigido uma “prova da dor” dos viajantes: Asha paga com suas lágrimas. Depois, é exigido o “fruto de seu trabalho”, pago com o suor da subida. Por último, exige-se o “tesouro do seu passado”, pago com as lembranças de Amata.

Quando elas finalmente alcançam a fonte, descobrem que já não precisam mais dela porque cada uma já conseguiu seu intento: Asha não está mais à beira da morte graças à poção de Altheda, que resolve ganhar dinheiro curando as pessoas. Amata também já alcançou seu objetivo ao se libertar das lembranças dolorosas que queria que a fonte levasse embora. Assim, o único que sobra é o cavaleiro, que surpreso com sua sorte, se banha na fonte e pede a mão e o coração da mulher que abriu mão da fonte por ele (Amata).

Assim, todos alcançam seus objetivos, sem jamais descobrir que a fonte não possuía nenhum poder mágico. Antes um “personagem” muito poderoso, a fonte se revela algo sem magia. A resposta do que eles buscavam não se encontrava com ela, e sim dentro de cada um. O caminho percorrido e os obstáculos vencidos se fizeram necessários para que cada um alcançasse sua vitória.

Dessa forma, a fonte deixa de ser o objetivo e simbolicamente se torna o meio pelo qual cada um deles irá alcançar seu destino. A narrativa do conto A fonte da sorte destaca algumas dificuldades que nós encontramos na nossa vida: superar obstáculos, tomar decisões, permanecer fiéis aos nossos valores. Então, por mais difícil que seja essa tarefa, certamente haverá um final feliz.

Guardem segredo, mas Natallie Alcantara já foi convidada várias vezes pela Hermione para traduzir livros escritos em runas.