Artigos

Dobby e as sementes da rebeldia

O eterno Dobby foi lembrado nas redes sociais do Potterish na última sexta-feira, graças à ocasião de seu aniversário. Por que não trazer, então, uma coluna sobre o elfo-doméstico mais importante em Harry Potter?

Dobby sempre teve em si uma sementinha de rebeldia que faria toda a diferença na vida de Harry e na dele próprio, para o bem e para o mal. Não deixe de ler a coluna que trago neste domingo e escrever o seu comentário!

Por Luiz Guilherme Boneto

Tal como o Ish sabiamente lembrou nas redes sociais, a última sexta-feira foi aniversário de Dobby, o nosso elfo-doméstico. Chamo-o de nosso, porque mesmo em Harry Potter, há poucos personagens tão carismáticos como Dobby. Em toda a série, ele é uma das figuras mais especiais e queridas entre os fãs.

A maioria dos potterheads gosta de Dobby pelos motivos triviais – e justos, diga-se de passagem. A simplicidade com que se dirige a Harry, a fidelidade, sua tentativa sistemática e constante de ajudar, todas as características básicas de Dobby fazem dele um personagem adorável. Há, contudo, outras razões para amá-lo, além do trivial.

Sabemos bem que, entre os bruxos, a escravidão dos elfos-domésticos é considerada absolutamente normal. Os livros deixam a situação bem clara: para humanos e elfos, a subserviência destes em relação àqueles é natural e presumível. Quando encabeça a Frente de Apoio à Libertação dos Elfos, Hermione pede a Hagrid apoio à causa, porém mesmo ele considera o movimento um ultraje. Sobre Dobby, o guarda-caça categorizou: “há aberrações em todas as espécies”. Com o perdão de Hagrid, questiono essa afirmação: será Dobby, de fato, uma aberração? Como espécie, os elfos-domésticos teriam nascido para servir?, ou como a maioria dos fatores que norteiam as sociedades, sua submissão doméstica seria tão somente uma convenção histórica? Pode-se argumentar que a “natureza” dos elfos os conduz a servir, porém não endosso tal afirmação. Criaturas inteligentes que são, e com excelente capacidade de raciocínio, não é crível pensar que os elfos teriam tal mentalidade por si próprios. Logo, o F.A.L.E. contaria com o meu apoio, se estivesse eu em Hogwarts à época de Hermione. Mas o trabalho não poderia acabar em si mesmo: seria preciso aplicar uma série de mudanças estruturais para que se chegasse, a longo prazo, num pensamento comum de que os elfos-domésticos não são escravos. Dobby, nesse processo, é um agente revolucionário. Embora não ousasse tentar uma fuga da casa dos Malfoy, o elfo demonstrava claramente a insatisfação para com sua situação, e mesmo um certo sentimento de rebeldia. Libertado com a ajuda de Harry, Dobby foi em busca de emprego, exigindo remuneração. Conseguiu-o em Hogwarts, onde o professor Dumbledore, em sua impávida sabedoria, não hesitou em oferecer a quantidade suficiente de galeões para satisfazer o novo funcionário.

Mesmo que seu “instinto” o impelisse numa eterna propensão à obediência, a chama da rebeldia sempre esteve acesa em Dobby, e cá entre nós, para o bem de todos. Dentre todas as cenas emocionantes pulverizadas nos oito filmes, a morte do elfo é a que faz com que eu me debulhe em lágrimas, toda santa vez em que eu assisto à sequência. Trata-se de uma cena perfeitamente bem executada, na opinião de um leigo, como eu. Do início ao fim de sua participação na série, o objetivo central de Dobby foi “salvar e proteger Harry Potter” em todos os sentidos possíveis, e esse desejo em ajudar causou sua morte.

Não tenho propriedade e nem a pretensão de afirmar que J.K. Rowling tinha a intensão de produzir em Dobby um instinto revolucionário, ou se ele era, tal como classificou Hagrid, somente uma “aberração da espécie”. Vejo-o, contudo, como um personagem singular, por quebrar todos os protocolos e padrões impostos à sociedade bruxa e por ver-se livre como indivíduo, único que era. Termino, pois, esta reflexão fazendo um adendo à forma como a iniciei: Dobby é, sim, o nosso elfo-doméstico, porém pertence tanto a si mesmo quanto a nós. Era, tal como ele gostava de se intitular, um elfo livre.

Juro que, ao escrever esta coluna, não quis ferir nem mutilar gravemente.