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A presença do novo

Os fãs de Harry Potter não leram os livros da série uma vez só. Muito ao contrário, são conhecidos por ler e reler várias vezes cada volume da saga, e alguns chegam ao ponto de conhecê-la de cor. Quando isso ocorre, naturalmente a leitura deixa de ser novidade.

Nossa colunista Nilsen Silva nos traz nesta segunda um ensaio sobre a falta que faz o elemento novidade na vida dos fãs, apesar do prazer que nos traz cada releitura. Não se esqueça de prestigiar a coluna com seu comentário!

por Nilsen Silva

Meu namorado está lendo Harry Potter pela primeira vez. E eu estou com inveja.

Quem já devorou a saga há dias, meses, anos, com certeza sabe do que eu estou falando. Da falta de novidade. Detesto ser saudosa e ficar presa à melancolia e aos dias que se foram, mas fazer o que se as coisas ao meu redor não colaboram para que isso termine? Um dia desses, a metade da laranja (ou da abóbora, para entrar no clima de Hogwarts) comentou comigo sobre como ele adora o professor Moody e eu pensei: “nossa, eu lembro de quando eu ainda estava descobrindo os personagens e pensando que fulano é demais, beltrano um chato e sicrano um cretino irremediável”.

Já faz tempo desde o dia em que eu terminei de ler todos os livros. Foi em 2008 mesmo, quando As Relíquias da Morte foi lançado. Fui com tanta sede ao pote, ou com tanta rapidez às páginas, que acabei tudo tão rápido… E então percebi que, depois daquilo, não haveria mais nada. Os dezenove anos tinham se passado, o Harry já era um menino grandinho, apenas um homem com cicatriz em forma de raio na testa, e tudo estava bem.

Assim, num piscar de olhos. Baque grande para quem passou a infância e adolescência lendo os lançamentos pouco a pouco e indo para a escola comentar com os amigos igualmente amantes da saga.

Acho que isso me fez pensar como eu sou sortuda por fazer parte dessa geração. Minha admiração a quem leu Tolkien, meu respeito a quem gosta de Anne Rice e minhas condolências a quem ama Crepúsculo. Sou fã de carteirinha mesmo, sou suspeita para falar, não sou parcial e não me importo: Harry Potter é a melhor coisa que já me aconteceu. É triste já ter lido cada uma das palavras – algumas mais de uma vez, por conta das releituras – e ficar estagnada em um lugar onde nada mais é novo? É. Mas é pior ainda só ler tudo agora e ter perdido a febre que só quem acompanhou o lançamento dos livros pouco a pouco sabe.

Mas, ei, tudo bem. Tem gente que não tem culpa de ter nascido depois, ou de ter adquirido o hábito da leitura um pouquinho mais tarde. O que importa é que todos estamos aqui reunidos, exaltando tudo de bom que há nesta série.

Não sei se alguém já leu o livro Harry E Seus Fãs, de Melissa Anelli. Quem não leu, eu recomendo o livro (mas isso renderia outro post enorme, uma resenha propriamente dita, então só vou me ater a: o livro é mágico). Foi este livro, na verdade, que me fez despertar para o pensamento do começo do post: a falta de novidade.

“Uma moça, não muito mais jovem do que eu, estava sentada perto do fim de minha linha de visão; também estava lendo, com a mochila colorida no colo e os braços ao redor, o livro funcionando como uma fivela para manter tudo no lugar. Eu me movi para o tubo de apoio seguinte para dar uma olhadela discreta mais perto; ela não estava lendo As Relíquias da Morte. Seu livro não era cor de laranja e sim cor-de-rosa, água e areia, e mostrava um garoto montado numa vassoura e um unicórnio branco. Harry Potter e a Pedra Filosofal. Ela nem reparou que eu a estava observando. Ah, eu invejo você, pensei, mas estava sorrindo por ela. Ela estava apenas começando”.

Se você ainda está lendo os livros, aqui fica o pedido: leia devagar. Aprecie as palavras, os acontecimentos e diálogos. Saboreie cada detalhe. Principalmente se você estiver adorando, e muito, a série. O vazio que fica depois de virar a última página não é nada fácil nem agradável de sentir. Se você ainda não leu os livros, fique triste por estar de fora, mas fique feliz por ainda ter um universo maravilhoso pela frente, esperando ansioso para que você o desvende. E, se você já leu tudo e também não sabe o que fazer…

Que tal escrever um pouco a respeito? Eu sei que isso sempre me ajuda.

Nilsen Silva mata as saudades sempre que escreve uma coluna.