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A vida e as frases de Albus Dumbledore

O maior mestre, mentor, tutor, sábio, o líder da Ordem da Fênix, grande figura paterna de Harry. Albus (ou Alvo) Dumbledore é o grande norte do mundo bruxo e deixou diversos ensinamentos antes de morrer para o jovem e para nós, leitores.

No entanto, como Rowling mostrou em “Relíquias da Morte”, Dumbledore era um ser humano com medos, contradições e segredos. Vamos relembrar então as grandes frases e momentos do ex-diretor de Hogwarts com a nova coluna de Mariana Rezende! Se algo ficou de fora, escreva nos comentários!


Em uma entrevista, J.K. Rowling revelou como a morte de sua mãe afetou não só a sua vida, obviamente, como também a maneira de abordar os sentimentos de Harry diante da perda dos pais. Tendo sofrido este baque durante a produção do primeiro livro, Rowling compartilhou com Harry um pouco da própria dor, dando a narrativa um toque humano, genuíno.

Assim como ela, todos nós já tivemos alguma visão de mundo alterada (ou confirmada) por experiências vividas. Não acredito que o passado tenha poder para moldar nossa personalidade, mas certos acontecimentos, certas lembranças – sendo elas agradáveis ou não – nos afetam, desconstruindo certezas outrora absolutas; e cabe a cada um decidir se este novo caminho apresentado é digno de ser percorrido.

Partindo disso, o que podemos dizer sobre Dumbledore? Mais especificamente, o que podemos dizer sobre as lições de vida passadas por ele? As conversas entre Harry e Dumbledore orbitam ao redor de temas complexos, inclusive considerados por alguns como complexos demais para leitores em fase de amadurecimento. De qualquer forma, a primeira geração pottermaníaca cresceu com as frases filosóficas do diretor na ponta da língua. E não foram poucos os que, com o passar dos anos, incorporaram em suas opiniões os clássicos pontos de vista de Albus.

Mas qual seria o cerne norteador desses argumentos, além das convicções pessoais de J.K.? Minha proposta na coluna de hoje é analisar como os deslizes cometidos na adolescência influenciaram os conceitos defendidos por Dumbledore na vida adulta. Não apenas nos discursos cheios de arrependimento explícito no sétimo livro, mas também nas entrelinhas das frases que tanto gostamos. Comecemos, então, do começo:

Pedra Filosofal, p. 253 e 254
“Afinal, para a mente bem estruturada, a morte é apenas a grande aventura seguinte.”

Antes do lançamento do sétimo livro, Dumbledore era a representação de uma mente bem estruturada – independente de seus ocasionais surtos excêntricos – emoldurada pela aura de onipresença e onisciência, sempre brilhando por trás dos óculos de meia lua. Foi, portanto, chocante descobrir que um dos maiores bruxos contemporâneos era, no final do dia, humano. Não estando isento de falhas. Repleto de egoísmo, sede de poder e obcecado pelos projetos de conquista da morte, Dumbledore sonhava em dominar o mundo bruxo. Subjulgaria os trouxas pela lei do mais forte, libertando-se dos grilhões que os trouxas lhe impuseram ao incapacitar Ariana.

Podemos elucubrar que, depois da morte da irmã e do sumiço de Grindelwald, Dumbledore tenha compreendido que existem coisas piores do que a morte física. (“Não tenha piedade dos mortos, Harry. Tenha piedade dos vivos e, acima de tudo, dos que vivem sem amor” RdM, p. 561). O poder por ele almejado custaria a destruição da moral, dos escrúpulos e já havia ceifado a vida de uma inocente.

Diferente de Voldemort, Dumbledore sentiu remorso por ter colocado as paixões cegas à frente da responsabilidade de ser um chefe de família. A negligência em relação aos cuidados essenciais para Ariana o afetou permanentemente (“A indiferença e o abandono muitas vezes causam mais danos do que a aversão direta” OdF, p. 673), talhando uma marca invisível na face já envelhecida ao converter o antigo egoísmo (direcionado para a conquista de metas pessoais) em um egoísmo carinhoso:

Ordem da Fênix, p. 677 e 678
“Eu me preocupava demais com você Harry. (…) Me preocupava mais com a sua felicidade do que com o seu conhecimento da verdade, mais com a sua paz de espírito do que com o meu plano, mais com a sua vida do que com as vidas que seriam perdidas se o plano fracassasse. Agi exatamente como Voldemort espera que nós, tolos, que amamos, façamos. (…) Que me importavam as inúmeras pessoas e bichos sem nome nem rosto sacrificados em um futuro difuso, se no aqui e agora você estava vivo, bem e feliz? Nunca sonhei que seria responsável por alguém assim.”

Isolado de qualquer relacionamento íntimo, o amor nutrido por Harry preencheu lacunas ainda não cicatrizadas, chegando a ter prioridade acima dos planos para o Bem Maior. Uma situação oposta à escolha no cenário entre Grindelwald e Ariana.

Câmara Secreta, p. 280
“São as nossas escolhas, Harry, que revelam o que realmente somos, muito mais do que as nossas qualidades.”

Para o adolescente Dumbledore, eram as qualidades que o faziam especial. A inteligência e a facilidade em aperfeiçoar suas habilidades mágicas o tornaram notório, ainda em seus anos de estudante. Para o adulto Dumbledore, a maneira com que as qualidades eram usadas é que define quem realmente somos. E o mesmo valia para os defeitos. Na Hogwarts dirigida por ele, todas as pessoas dispostas a reparar seus erros encontravam uma segunda chance. Um gesto coerente, visto que o próprio Dumbledore somente conseguiu pavimentar seu caminho na segunda tentativa, tendo então optado pelo o que era certo; e não fácil.

O amor, a dor da perda, o salvara, desanuviando seus escrúpulos da paixão – por Grindelwald e – pelo poder. Neste contexto, não é de se admirar que “apenas” o amor que Snape sentia por Lily bastou para convencê-lo de que o sonserino lhe era fiel. O amor marca, muda as pessoas.

Entretanto, as tentações ainda o assombravam. Em duas ocasiões exemplares, Dumbledore demonstrou medo de que os outros – assim como ele – sucumbissem às fraquezas. Ele manteve Snape longe do cargo de DCAT, temendo que o ex-comensal fosse seduzido pelas Artes das Trevas. E manteve Harry ignorante quanto à existência das Relíquias da Morte, pois: “eu só receei que você fracassasse como eu. Só temi que repetisse os meus erros. Imploro o seu perdão, Harry. Já faz algum tempo que sei que você é um homem melhor do que eu.” (RdM, p. 554)

Cálice de Fogo, p. 562
“Você está cego de amor (…) pelo cargo que ocupa, Cornélio! Você atribui demasiada importância, como sempre fez, à chamada pureza do sangue! Você não consegue reconhecer que não faz diferença quem a pessoa é ao nascer, mas o que ela vai ser ao crescer!”

Decidido a não repetir os mesmos erros, Dumbledore se afastou das tentações. Maduro o bastante para admitir sua incapacidade em dominar suas fraquezas, recusou diversas vezes o cargo de Ministro da Magia. Reconheceu em Fudge falhas semelhantes e as apontou, talvez enxergando no Ministro um futuro que teria lhe pertencido caso aceitasse o cargo de poder. E todos esses cuidados foram justificados, quando Dumbledore fraquejou ao encontrar a Pedra da Ressurreição na casa dos Gaunt. Esquecendo-se que não faz bem viver sonhando ao invés de viver, Dumbledore buscou na Pedra (da mesma forma que visualizara no espelho de Ojesed) uma forma de reencontrar a família e, assim, se redimir por seus atos.

Concluindo, as frases de Dumbledore são interessantes por instigarem reflexões sobre as nossas atitudes. E, ainda, refletem uma história trágica e imperfeita, que culminou em um diretor que foi referência sentimental e moral para a sociedade bruxa; e para todos os trouxas que aprenderam com ele, e o perdoaram porque também são tolos que amam. Dumbledore é um belo exemplo de como a sabedoria pode se esconder nos cantos mais escuros do nosso passado. Tudo que precisamos fazer é lembrar de acender a luz.

Mariana Rezende não conta para ninguém, mas tem uma Varinha das Varinhas escondida em casa.