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Olhares da plataforma [completa]

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Abaixo, você tem os testemunhos completos de membros do Potterish sobre seu primeiro contato com a série Harry Potter. A coluna original, você confere aqui.

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EDIÇÃO: Luis Nakajo

Alguns leram o Potter nosso de cada dia pelo começo -outros, pelo meio, a partir do quarto volume (ou pelo terceiro). Alguns receberam a carta-convite através de um programa de rádio -outros, pela Amanda ou pela tia Elaine.

Abaixo, você lê histórias de leitores de Harry Potter. O início de longas jornadas a partir da mesma plataforma.

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BRENO ALVARENGA: Um Natal com título verde

Pisei sobre os ladrilhos tantas vezes citados, vi os guardas tantas vezes personificados. Olhei para a placa com os dizeres: “Estação de trem King Cross” e me certifiquei de que era tudo realidade. Relembrei as primeiras impressões de Harry e as revivi, e me iludi tentando procurar por Harry, Hermione e Rony acenando para seus filhos entre as milhares de pessoas ali, que, por sua vez, não compartilhavam das mesmas impressões.

Estar ali me lembrou o natal de 2001: meus tios riam em um canto de piadas sujas, as mulheres carregavam, orgulhosas, seus pratos de comida e eu e minha irmã bisbilhotávamos os presentes. Ao iniciar a entrega destes, foi-se anunciado: “Luiza e Breno, de sua querida Tia Elaine”. Minha irmã alcançou o pomo de ouro primeiro e o abriu. Nossos sorrisos desvaneceram instantaneamente: era um livro. E como se não bastasse, enorme. Seu título (verde brilhante) era, para mim, aos 10 anos, impossível de ser lido. Passei o resto da noite no canto, chateado. Esperava tanto por um jogo e ganhara “aquilo”?

Passado um mês minha irmã resolveu dar chance ao livro, e eu, escondido, ainda com raiva, a via ora rindo, ora assustada, ora fascinada. Quando o acabou, passou-o para mim, que, ainda raivoso, hesitava em ler. Minha mãe, insistente, clamava que minha tia ficaria absurdamente chateada se soubesse que eu não o lera, e não cansava de repetir: “Sua tia disse que esse livro levou milhões de pessoas, de pijamas, no mundo inteiro a enfrentar filas enormes nas livrarias para comprar o seu.” Enfim, dei chance ao livro.

O primeiro capítulo me pareceu confuso e cansativo. Seria uma ótima desculpa para o término da leitura. Nada disso. Minha mãe voltou com seu discurso de disco arranhado, e voltei à labuta. Parei de sair, dormia pouco, não conversava com ninguém. Apenas lia. O fascínio me tomara por completo. Era o livro pelo qual eu ansiava a vida toda sem saber. Meus sonhos mais inverossímeis estavam reunidos naquelas 263 páginas. O fato de reunir escola com a palavra “prazer” me maravilhava, e estas duas, junto às palavras “magia” e “aventura”, me deslumbravam. Aquilo foi o primeiro passo de uma era, crescer com Harry, Hermione e Rony foi algo cativante. Eles, que construíram tijolo por tijolo minha índole e alma.

Levantei-me, e me dirigi à plataforma sem olhar para trás. Era hora de me despedir de tudo aquilo. O coração e cada uma das células de meu corpo guardava um momento diferente, uma lágrima, um sorriso, uma aventura.

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BRUNA MORENO: Who-the-hell-is-she?

Daqui, da estação King’s Cross — o lado trouxa —, olhar a parede de tijolos entre as plataformas nove e dez chega a ser nostálgico. Sim, pois ainda posso me lembrar perfeitamente da exata primeira vez em que encontrei a magia…

Eu tinha 11 anos quando a coruja veio até mim.

Não era uma coruja, na verdade; seu nome era Amanda, e ela era minha colega de classe da sexta série. Naquele certo dia, ela veio até mim antes da aula com inconsoláveis olhos marejados: “Ela virou pedra, Bruninha! Ela morreu!”. “Calma, quem morreu?” eu perguntei, no que ela respondeu “A Hermione, oras!”. Olhei para ela com uma expressão — adiantadamente inglesa — do tipo who-the-hell-is-she?, e foi aí que tudo começou.

Minha amiga me levou até o Beco Diagonal — no mundo dos trouxas, a biblioteca da escola — para que eu conseguisse meu primeiro livro de magia, “A Pedra Filosofal”. Na época eu já gostava de ler, ah sim; terminei aquelas 263 páginas com Harry em cinco dias e, wow!, eu precisava de mais. Voltei à biblioteca, aluguei o volume dois, terminei-o na madrugada do meu segundo dia de leitura (“Bruna, são quatro da manhã, fecha esse negócio e vai dormir!”). O terceiro, tive que pegar com outra amiga; no livro dela derramei minhas primeiras lágrimas da série, com pinguinhos do molho de tomate da minha janta (sobre os quais, aliás, nunca tive coragem de contar), e precedi o choro geral e inevitável do próximo livro, o quarto, que viria a ser final e verdadeiramente meu.

Em meados daquele julho de 2001, eu já tinha comido e re-engolido a somatória de páginas da série de forma voraz e inconsolável diversas vezes, e não tinha perspectivas de parada. Mas se Hogwarts não vinha até mim, eu fui até Hogwarts, e foi assim que me lancei às atividades incessantes de ficwritter — que sou, ainda hoje — e comecei a escrever onde quer que houvesse papel e caneta; ou onde quer que minha imaginação me contasse algum segredinho sobre os Marotos; ou quando quer que uma teoria absurda revelasse porque Voldemort quis matar os Potter; ou quando quer eu me decidisse, enfim (e temporariamente), quem era mais sexy, o Lupin ou o Snape.

Então, percebi que já tinha ultrapassado a barreira concreta da estação de trem; a Plataforma 9 ¾ cintilava diante dos meus olhos como se sempre estivesse lá, visível. Aquele mundo já fazia parte de mim, e eu, dele. Não quis deixar a magia nunca mais.

Hoje, olhar da estação King’s Cross é… estranho. Porque já deixei de ser trouxa — e não só muggle! — há muito tempo.

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DAIANE LIBERO: Cabines sucessivas no Expresso

A fumaça que saía do grande expresso vermelho parecia não querer me deixar ver; era, ou deveria ser a mesma que insistia em embaçar minha vista, saída de um cigarro alheio, densa, fazendo meus olhos lacrimejarem. O que eu tentava olhar, lembro nitidamente: num grande cartaz, um garotinho de olhos verdes parecia sorrir, no pôster do primeiro filme de Harry Potter, “A Pedra Filosofal”.

Chegar perto deste pôster, tal qual os estudantes afoitos de Hogwarts se aproximam do grande trem escarlate, foi uma emoção. Nunca havia lido o livro, apesar de muito ouvir falar pela boca de minha prima, e o filme era uma novidade e tanto. Do cartaz exposto no cinema central da cidade, fui direto a uma livraria que alugava livros por um preço módico, inexplicavelmente perto, e que hoje, no endereço, resta apenas uma casa à venda. Sorte batendo à porta, minha mãe tinha cadastro ali. Emprestei o primeiro livro da saga e devorei-o em poucos dias.

Assim como o herói de cabelos revoltosos, eu me sentia encantada com a abóbada do castelo, mostrando o céu estrelado, inserida naquele mundo que me mostrava mais do que crianças que eram capazes de fazer coisas magníficas. A câmara secreta se mostrou uma saga mais profunda, e daí em diante, cada livro trazia uma textura, um palato diferente. A evolução de livro a livro acontecia naturalmente. Minha cabine no expresso não ia vazia, ano após ano; conheci pessoas que partilhavam do mesmo encantamento.

Já me sentia envolvida, sugada, apaixonada. Foram noites em claro primeiro pelos quatro primeiros livros existentes na época, depois pelas fanfics que eu, no alto dos meus doze, treze anos, achava que sabia escrever. A ansiedade pelo próximo livro, e em menor grau, pelo filme seguinte, me consumia. Isso durou até o lançamento de “Relíquias”.

Confesso que demorou, mas, enfim, numa noite chuvosa de um julho perdido, eu fechei o sexto livro, “Harry Potter e o enigma do Príncipe”, relido pela décima quinta vez e suspirei. Um mundo de palavras, lânguidas e profundas, que me acompanharam na infância e na adolescência, haviam conseguido me mudar de tal forma que não me lembro tanto das coisas antes de pisar no primeiro degrau daquele imenso expresso vermelho, na plataforma apinhada de alunos, gaiolas, bruxos. Aaquele dia ficou na memória para sempre, do momento em que vi os olhos brilhando no cartaz e em que a capa desgastada do primeiro livro, na livraria “de aluguel”, tocou minhas mãos.

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DANIEL MÄHLMANN: Orgulho engolido

No meio de 2001, o que eu mais ouvia do meu melhor amigo era “Harry Potter”. O que raios tinha encantado o Felipe naquele livro para crianças? Ele até tentava me convencer a ler, mas as capas não me animavam. Eram muito coloridas e, no auge da rebeldia dos meus 15 anos, eu achava que tinha passado dessa fase.

Para fazê-lo parar com a insistência, eu pedi o primeiro livro à minha tia. Ganhei-o na véspera de Natal com certa timidez misturada, admito, com uma pitada de curiosidade. Eu não saberia explicar naquela época, mas tinha algo especial naquele livro que me fazia, durante alguns momentos, voltar para dar uma olhada em sua capa. Mesmo parcialmente atraído, eu achava que aquela história devia ter uma trama superficial para entreter crianças.

Comecei a ler “Pedra Filosofal” no dia seguinte. As primeiras páginas não me atraíram muito, parecia um livro como outro qualquer… mas a minha atenção começou a se prender quando Harry e Hagrid foram às compras em Hogsmeade, e se fixou completamente quando o garoto foi para Hogwarts.

A ação e as reviravoltas do final me fizeram terminar de lê-lo faltando menos de uma hora para a virada do ano. Ao falar com o Felipe durante o reveillon, disse que o livro era legalzinho, e prometi comprar o segundo apenas para ver como a história se desenrolaria – uso de palavras propositalmente desinteressadas para alguém cujo orgulho não podia ser vencido tão facilmente.

Comecei a minha viagem por “Câmara Secreta” em 1º/1/2002 com uma ansiedade que só a minha família podia vislumbrar. O mistério e a complexidade um pouco maior deste livro me prenderam completamente. Mas ainda assim meu orgulho não deu o braço a torcer, e eu disse ao Felipe que a história era muito repetitiva; o Voldemort sempre tentaria tomar o poder e Harry conseguiria frustá-lo ou vencê-lo. Ele apenas riu e sugeriu que eu comprasse o terceiro.

Em “Prisioneiro de Azkaban”, a última desculpa para não admitir a minha paixão desabou. A trama tão bem desenhada, as descobertas e as novas personagens me conquistaram facilmente. A desenvoltura com a qual o final nos é apresentado, mexendo com uma coisa tão imutável como o tempo, fez uma pessoa racional como eu achar que aquilo fazia sentido.

O meu encontro com o Felipe foi engraçado. Eu cheguei com a aparência de derrotado e admiti tudo. Tinha ficado claro, para mim, que Harry Potter possuía um núcleo denso e complexo de onde sua autora retirava e nos apresentava alguns detalhes ao longo dos volumes. Essa minha conclusão apenas se fortaleceu no decorrer de minha leitura.

Hoje esse meu amigo deixou de ser fã. Ele teve a chance de comprar “Ordem da Fênix” nos EUA antes de mim, mas nunca chegou a ler. E eu… bem, eu continuo tão bobo quanto fiquei quando li Harry em Hogwarts, com violentos frios na barriga a qualquer novidade apresentada, e webmaster do Potterish, site que me acompanha desde o início dessa minha trajetória.

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LARISSA ALMEIDA: A magia dentro de nós

Lembro-me como se fosse hoje da primeira vez que cheguei à estação de King’s Cross e atravessei, com certo receio, a plataforma 9 e ½.

Diferentemente de todos aqueles estudantes que lá estavam, nenhuma coruja chegou à minha casa com uma carta de Hogwarts no bico. Eu entrei neste mundo de forma diferente.

Há sete anos atrás, um colega da escola trouxa disse que tinha um livro legal para me emprestar. Eu nunca imaginei que aquele dia pudesse mudar a minha vida. Ele havia dito que era só um livro. Algum tempo depois, descobri que era bem mais que isso. Eu tinha em mãos uma ‘chave de portal’. E esta chave de portal me levou a um mundo mágico.
Até aquele dia, eu achava que magia se restringia a feitiços. Agora eu sei que magia é algo muito mais grandioso, é algo que vai além do que sai de uma varinha. Eu aprendi que a magia mais poderosa é aquela que está dentro de cada um de nós.

Ao longo deste tempo eu fui ganhando outras chaves de portal. Hoje tenho sete, e guardo-as com zelo na minha prateleira. Elas me levaram a lugares fantásticos e a aventuras incríveis, e estas lembranças eu guardarei para sempre porque os anos que passei em Hogwarts foram inesquecíveis.

Certamente que sentirei saudades de cada momento marcante, de cada nova descoberta, de cada lição aprendida, de cada emoção vivida. Mas eu sei que, apesar de o meu tempo de escola ter acabado, o Expresso nunca deixará de partir a cada 1º de setembro. Isso não tem fim. Basta acreditar.

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LUIS NAKAJO: ‘Potter’ de hipermercado

A carta de convocação tinha chegado (em apenas uma via, através da maciça exposição de J. K. Rowling quando lançaram o primeiro filme) e eu, então cidadão do interior, corria à procura de algum livro da série (para testar aquela coisa de que todos falavam). Eu não tinha visto o filme. Mas, com freqüência, me vinha aquele nome bizarramente simples: Harry Potter. Era “Harry Potter filme”, era “Harry Potter livro”, era “Harry Potter fenômeno”, era “Harry Potter best-seller”. Era um vendaval de Harry Potters.

Em Mogi, a única livraria da cidade não tinha A Pedra Filosofal que eu queria. No hipermercado recém-aberto e bem grande (e com mais livros que a livraria em questão), o único exemplar que tinham na época era “Prisioneiro de Azkaban”. Eu vi aquela capa tão colorida, com traços tão garbosos, soltando aquele cheiro delicioso de tinta e de papel alcalino –e acabei levando assim mesmo. Que se dane, pensei eu, começo pelo terceiro. Eu tinha 14 anos.

A plataforma 9 ½ se materializou num vórtice violento de espaço-tempo.

A fumaça embaça um pouco do que vejo do passado, mas lembro que acabei comprando os outros três livros pelo antiquado método de encomendas. Os livros demoravam uma ou duas semanas para chegar na pequena livraria, onde predominavam os Paulo Coelhos.

Ao fim do Cálice, me deparei com a angústia do “ai, meu Deus, e agora?”. Demorou um ano e meio para que eu ouvisse que o quinto livro ia sair. Eu o encomendei na Cultura, junto, afobado que estava, com os quatro livros já publicados em inglês. “No original”, eu repetia todo trêmulo.

Comecei lendo o Prisoner. Este livro tem algo de mágico para mim. Foi meu modo de ingresso nas longuíssimas sessões de leitura que se seguiram. A plataforma agora era a 9 ¾, e a aventura era bem mais difusa (meu inglês me obrigava a parar três, quatro vezes por página, algo pelo qual sou extremamente grato).

Em 2005, Prince vinha à baila. Encomendei na Saraiva e, no dia fatal, um sábado, estava lá o Sedex com o livro, no café-da-manhã! Li um livro que eu esperava para a outra terça-feira! (e agora, thank God, eu voei pelas páginas em dois dias e meio).

Em 2007, matei a lombriga de ir a uma “festa de malucos”, daquelas que mostravam na TV. No Conjunto Nacional, na Avenida Paulista que eu amo, eu vi uma aglomeração tão inimaginável de seres agarrando os cabelos e dando surtos no balcão de reservas de livros, que, até hoje, não sei direito o que senti no momento em que eu tive Hallows nas mãos. Foi o primeiro dia em que passei da meia-noite lendo um livro. Como uma locomotiva cortando a noite escura.

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MARISA AMANTE: Empoeirado nunca mais

Faz algum tempo que visitei a locomotiva vermelha pela primeira vez, mas me lembro bem dos detalhes. Confesso que perdi muito tempo achando que HP era uma modinha meio idiota. Tinha sido apresentada a livros infantis terríveis desde que me entendia por gente, então era absurda a minha incredulidade de que algum dia pudesse ser apresentada a um livro infanto-juvenil que valesse a pena. Além do mais, a sinopse sobre um garoto bruxo com um raio na testa servia bem demais no hall das fantasias ruins que era obrigada a ler na escola.

Era lá pra 2001, então todos comentavam o filme, trocavam figurinhas, e só alguns poucos haviam de fato lido os livros. Uma amiga minha fazia parte desse grupo. Tendo acompanhado Harry Potter desde o lançamento de “Pedra Filosofal” no Brasil, a coitada não economizou saliva tentando me empurrar o primeiro volume – agora reconheço, nos argumentos dela, a conversa que depois eu passei em várias pessoas, tentando convencê-las de que bons livros não mordem.

Aceitei a contragosto e o bichinho passou algum tempo pegando poeira na minha estante, enquanto minha amiga continuava insistindo para que o lesse. Um dia, devo ter resolvido que era melhor ler logo para ela sair do meu pé. Ou talvez não houvesse nada de interessante na TV, exceto a reprise de Disk MTV. Ou talvez (e mais provavelmente) não houvesse absolutamente nada na TV. Só me lembro do que veio depois.

Eu tinha 11 anos, e nenhuma carta de Hogwarts poderia ser melhor que essa. Não preciso dizer que minha amiga levou a melhor. Hoje ela não é mais fã e é quem tira com a minha cara quando eu digo que tenho que comprar uma camisa nova para o cosplay – tudo com o maior bom-humor, claro. Não foi Pedra Filosofal que me trouxe de vez para o fandom (esse papel coube a Ordem da Fênix), mas ninguém esquece a primeira vez em que bateu os olhos nesse mundo mágico e reconheceu algo extremamente familiar e, ainda assim, diferente de tudo o que veio antes.

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PÂMELA LIMA: Até o fim

Não era dia primeiro de setembro de 1991, e eu não tinha onze anos. Embarquei no Expresso de Hogwarts pela primeira vez em uma noite de verão, quando constatei que não tinha nada para ler. Meu primo (que também não tinha onze anos) me levou na plataforma 9 ¾, apresentando-me “Pedra Filosofal”. Ele mesmo nunca havia ido até o trem, o que eu comecei a considerar um desperdício logo que atravessei a barreira entre o mundo mágico e o trouxa. Quando avistei Harry pela primeira vez, achei-o muito engraçado. Uma gracinha, na verdade. Já tinha-o visto no cinema, certa vez, quando ele tentava tirar certa menina ruiva de certo dono de um diário. Não prestei muita atenção. Um vagão, dois, três vagões. Resolvi deixar um pouco o Expresso de lado e dormir. Quando acordei, Harry e Ron estavam lá. Logo, Hermione e Neville.

Fui mais uma vez ao Expresso em menos de um mês. Vi as desconfianças de Harry com Snape, a amizade crescente com Ron e com Hermione. Derrotei um trasgo com eles. Na segunda vez, vi mais de perto ele salvando a menina ruiva, que agora eu conheci (não tão bem quanto gostaria). Seu nome era Ginny. Existem coisas que não se pode fazer com uma pessoa sem que se acabe gostando dela. Esses são bons exemplos.

Na terceira vez que entrei naquele trem, agora com o misterioso professor Remus Lupin nos acompanhando, descobri que estava envolvida. Que não era apenas uma amizade, era um amor fraternal. Soube imediatamente que Harry era não só uma grande pessoa, mas que era parte integral de mim. Amei, sofri, chorei, concordei, desconfiei, com ele e por ele. Li seus pensamentos, e quis descobrir ao seu lado os mistérios que envolviam a morte dos seus pais. Descobrimos isso juntos, como descobrimos a força do verdadeiro amor, os segredos dos maiores inimigos e a grandeza da alma dos mentores.

Eu e Harry. Até o fim.

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RODRIGO BRUNO: Sessões seguidas

Chega a ser engraçado pensar que fiz questão de vir até Londres e viajar de trem apenas por causa de um personagem literário: Harry Potter.

Desembarcar na estação King’s Cross me fez me sentir um pouco na história também… Imagine que cheguei a tocar o local onde fica a Plataforma Nome e Meio com esperança de poder chegar a Hogwarts…

Infantilidade minha… Doce infantilidade minha.

Ainda lembro como foi o meu primeiro contato com o universo HP; era uma tarde ensolarada e eu estava em casa ouvindo rádio quando o locutor fez uma forte crítica o um novo livro que estava sendo lançado no país, acusando-o de incitar as crianças à bruxaria e de pregar a magia negra de forma mascarada. Sim: ele estava falando de “Harry Potter e a Pedra Filosofal”. A matéria chamou-me a atenção, mas não o suficiente para me tirar do aconchego do sofá onde eu estava espichado e me fazer buscar algo na internet. Tempos depois, passando por um cinema da minha cidade vi o cartaz de um novo filme: Harry Potter e a Câmara Secreta. Gostei tanto do filme que assisti a duas sessões em seguida.

Alguns anos se passaram, eu já estava no último semestre do colegial quando fui fazer estágio em uma biblioteca próxima a minha casa; e lá estavam eles na estante, os quatro primeiros livros de J. K. Rowling: a Pedra Filosofal, a Câmara Secreta, o Prisioneiro de Azkaban e o Cálice de Fogo. Devorei-os com uma ferocidade como nunca antes com qualquer livro. A partir dali percebi a amplitude do que estava em minhas mãos.

Se hoje escrevo, devo muito disso a essa grande autora que é J. K. Rowling e a seus personagens, que me encantaram por anos.

E assim eu deixo a estação de King’s Cross, com pesar no coração de não poder atravessar essa parede de cimento, que é a Plataforma Nove e Meio, como faria o personagem que me motivou a estar aqui hoje: Harry Potter.

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SHEILA VIEIRA: A plataforma se acessa do metrô

Dia de verão, fim de 2002: o relógio começou a apitar e eu percebi que ele marcava 3 da tarde. Foi então que meu estômago deu um imenso ronco e minha mãe veio a mim reclamar: “Menina, você não larga esse livro há sete horas! O almoço está gelado!”.

Meus olhos voltaram a encarar o livro aberto em minhas mãos, e eu notei que poucas coisas naqueles 13 anos de idade que eu tinha haviam me envolvido tanto quanto a história de um menino bruxo inglês, então apenas um ano mais novo que eu. Havia algo que unia Harry Potter, naquele momento lutando bravamente contra um basilisco, comigo, uma pacata garota na zona leste paulistana. Hoje, com quase 19 anos, encarando a plataforma 9 ¾, percebo que Harry, além de batalhar com cobras e bruxos das trevas, era um rapaz em busca de personalidade, amor, amizade, lugares, confiança, talentos, enfim, de uma identidade, assim como eu, como nós.

A obra da Tia Jo não foi minha primeira aventura no mundo mágico. Esse crédito vai ao programa de tevê Castelo Rá-Tim-Bum, que, em termos de excentricidade de personagens até faz frente à jornada de Potter. J. K. chegou a mim através de minha irmã mais velha, cansada dos livros da faculdade, sedenta por algo de entretenimento. Como não fazia nada além da escola, comecei a ler também. “Pedra Filosofal” me interessou, mas não cativou. Porém, a personalidade de Hermione (personagem que eu já assumi como alter-ego) e o xadrez dos bruxos me levaram a conferir “Câmara Secreta”. A guinada sombria a partir de “Prisioneiro de Azkaban” me garantiu como fanática.

Tive a felicidade de ler todos os livros antes de ver as adaptações para o cinema. Muitos dos meus colegas não tiveram a mesma sorte, e ouvi diversas gozações. Mas até nisso Harry me ajudou: ao defendê-lo, exercitei minha capacidade de argumentação!

Portanto, ao estar aqui na King’s Cross, lugar em que eu fingia estar quando passava pela estação de trem da Luz, imaginando que a baldeação para o metrô era a passagem secreta para a plataforma 9 ¾, sinto-me como Harry vendo seu filho partindo para a escola. Na verdade, queria que o mundo inteiro entendesse que esses livros são muito mais que produtos de marketing bem sucedidos: são a marca de uma geração trazida de volta à literatura. Nós somos a prova disso!

Mas, enquanto isso não acontece, despeço-me de meus pais e entro no trem à procura de uma cabine vazia. All was well.

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VICTOR MARTZ: Amigos

Tinha medo. Não, não, medo é exagero, tinha receio. Receio? será que é muito? Aliás, o que sentia quando me deparei com aquela estação enorme, cheia de pequeninas mentes embarafustadas no meio de uns livros com capas coloridas, soltando fumaça pelas orelhas? A única coisa de que me lembro é que não tinha o menor interesse pelas histórias desse bruxo. As capas meio que me enojavam (sim, enojavam); não atraiam minha atenção, então eu simplesmente resolvi ignorar a existência daquele mundo existente escondido por trás de uma parede maciça em uma estação de trem.

Não por muito tempo. Magia é magia e não tardou a se manifestar em mim. O filme tinha sido lançado e eu ainda me perguntava quem era aquele menino estranho, cabeçudo e quatro-olhos e porque raios as pessoas não paravam de falar dele. Foi quando vi a capa do “Cálice de Fogo” e foi paixão a primeira vista (sim, sim, eu julgo, sim, um livro pela capa, obrigado). Comecei assim a minha jornada: embarquei nesse expresso no seu quarto ano, voltei no tempo para rever os acontecimentos dos anos anteriores e depois segui viagem para o futuro.

E que futuro, hein? Quem diria que Harry Potter, essa franquia que vale bilhões, enfeitiçar-me-ia de tal forma que eu perdesse noites de sono, dias de sossego, notas no colégio e alguns compromissos com amigos? Antes que me olhem chocados, achando que sou mais um maníaco do trem, louco por Harry Potter e que não consegue enxergar outra coisa na vida, deixe-me explicar a segunda parte Potteriana na minha vida.

Embarcado como estava no expresso, estava prestes a desembarcar no sexto ano da minha aventura mágica. Resolvi por bem, entrar em uma cabine um tanto agitada do trem, uma cabine em que as pessoas pareciam tão alegres e dispostas a discutir Potter quanto eu estava na época. Ah, mais um fórum, mais uma galera para brincar de magia por alguns meses, mais um pessoal que será esquecido depois de um ou dois meses após a leitura de “Harry Potter e o Enigma do Príncipe”.

Pura ilusão. Quanto mais o tempo passava, mais me envolvia com aquele povo, menos vontade tinha de sair da cabine, mais queria que a viagem se alongasse por tempo indeterminado para eu poder conversar com eles não só sobre Harry Potter, mas sobre tudo que amigos conversam. Amigos? Sim, depois de anos da minha primeira viagem, depois de anos em que olhei para a capa de Pedra Filosofal com nojo, posso dizer com segurança, sem medo de ser feliz, que o maior presente que Rowling pode ter me dado foram meus amigos.

A cabine em questão está no Orkut.

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VÍTOR WERLE: Embarque atrapalhado

A Potter-paixão veio de confusão que na época me pareceu tão perdoável, mas agora, aos olhos do Vítor de 16 anos, me parece um daqueles pecados capitais de que todo fã procura fugir. Confesso que ler “Câmara Secreta”, antes da descoberta do mundo mágico foi uma experiência burra e ao mesmo tempo muito divertida. Tirando o fato de não ser apresentado ao Beco Diagonal, à querida família Weasley, a ingenuidade do Harry primeiro-anista e tudo aquilo que foi deliciosamente servido em “Pedra Filosofal”, eu tive a certeza de que a magia dos livros estava presente em toda a sua evolução, mesmo que apenas no pedaço mal-explicado que me instigou a descobrir – voltar ao passado, lendo o primeiro livro – e não largar o trabalho de Jô até o próximo capítulo, o próximo capítulo e o próximo em extensas e proveitosas jornadas de até 24 horas [e é sério!].

Embora a história de Harry tenha me prendido inicialmente de forma literária, unicamente para me satisfazer como leitor, ela também exerceu influência ao me trazer para o fandom da série e não permanecer apenas do outro lado do muro. E assim, tenho a certeza absoluta que esse espírito de interação e contribuição para uma comunidade de fãs mais unida só estende a mensagem que Jô legou através dos seus livros. E cá estou, firme e forte na companhia diária de amigos com que Potter, e de certa forma o Ish, me presentearam.

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YURI RIGON: O filme e o original

Em meio a toda essa confusão, começa a aventura. Pessoas correndo para entrar no trem, mães despedindo-se de seus filhos (dando conselhos e mais conselhos) e eu aqui, parado, lembrando de como tudo começou.

Parece que foi há pouco tempo que descobri o mundo de Harry Potter, mas não foi tão pouco assim. Afinal, as fitas de vídeo saíram do comércio há bastante tempo, e foi com uma delas que tive o meu primeiro contato com a obra, através de “A pedra filosofal”.

A princípio, gostei do filme. A essência de um mundo com magos, varinhas e vassouras voadoras sempre foi abordada em vários filmes, porém, não com tanta criatividade e individualidade por parte da autora como nos livros de J.K Rowling. Com o passar de algumas semanas, fiquei sabendo da existência de um segundo filme e então, procurei por ele e o encontrei. Depois de ver os dois filmes, a vontade por um terceiro aumentou, porém este ainda não existia. Foi então que chegou aos meus ouvidos a existência de livros sobre a série. Não li os dois primeiros, mas sim o terceiro, já que queria dar continuação à trama. Em 2004, fui aos cinemas com o lançamento de “O Prisioneiro de Azkaban” e só então vi o que eu poderia ter perdido em não ler os dois primeiros livros, pois percebi que entre o filme e o livro, existiam diferenças significativas. A partir desse momento, passei a não gostar tanto dos filmes e preferi ler os livros.

Depois de ler “A pedra filosofal” e “A câmara secreta”, parti em direção ao quarto livro e assim sucessivamente. Hoje, entendo o quanto a obra significa para várias pessoas e também para mim.

Agora, se me dão licença, o apito acabou de soar e todos já estão no trem.

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O staff de colunistas do Potterish opera desde 11 de julho de 2006. Ao longo de mais de dois anos e oitenta colunas, passou pelas mãos de três editores e entra agora sob o reinado de Isadora Cecatto, longa contribuidora do projeto. Sua primeira coluna, sobre Harry e Gina, foi postada em 29 de novembro de 2006. Isadora, como sinal de boa sorte, publicou 7 belos textos -sem contar o incluso nesta coletânea (que tem, como sinal de mal agoiro, 13 contribuições).