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Qual é o seu bicho-papão?

Nada mais horrível do que sentir medo, não é mesmo? Muitas vezes, o temor excessivo nos impede de executar várias tarefas, algumas delas básicas, como entrar num elevador ou num ambiente sem janelas.

Para conhecer seu maior medo, os bruxos têm a opção de enfrentar um bicho-papão, tema de que trato na coluna deste domingo. Mas e você? Sabe qual é o seu maior medo? Qual seria o seu bicho-papão?

Por Luiz Guilherme Boneto

Basta uma rápida procura sobre sensações temerosas para constatar: a recomendação de todos os profissionais e especialistas para vencer o medo é enfrentá-lo de pronto. Trata-se de uma informação necessária a pessoas que sentem arrepios ao realizar tarefas simples, como dirigir, entrar num elevador, subir em grandes alturas. A recomendação, porém, é óbvia: enfrentar um medo tem como pré-requisito a coragem, e com várias doses de coragem, pode-se vencer qualquer temor, ou ao menos controlá-lo.

Há, pois, criaturas mágicas a auxiliar nesse processo. O professor Lupin, enquanto lecionou Defesa Contra as Artes das Trevas em Hogwarts, ajudou seus estudantes a enfrentar seus temores de uma forma até mesmo divertida: contra um bicho-papão, enfiado num velho armário da sala dos professores. Embora a situação fosse um tanto quanto embaraçosa – para Neville Longbottom, o bicho-papão tomou a forma do professor Snape –, Lupin mostrou aos seus alunos de terceiro ano o quão ridículos seus medos poderiam se tornar. Riddikulus!, o breve feitiço que travestiu Snape com as vestes da avó de Neville, cortou as pernas da aranha de Rony Weasley e retirou as bandagens da múmia de Parvati Patil, fazendo-a rolar pelo chão. Naquela aula – atrevo-me a classificá-la como uma das melhores assistidas em Hogwarts naquele ano –, apenas Harry e Hermione ficaram sem enfrentar o bicho-papão, ele pelo temor (!) do professor Lupin de que o bicho-papão se transformasse em Lord Voldemort, e ela porque, conforme observou Rony muito oportunamente, a criatura provavelmente se transformaria num dever de casa que recebeu nota nove em dez.

Fico eu a pensar nos meus próprios temores, que existem aos montes, e nos alheios também, e me ponho em seguida a projetá-los para o universo bruxo. Creio que, por mais que reflita, não conseguiria dizer qual é o meu maior medo. De igual modo, não saberia dizer qual o meu maior e mais profundo desejo, a não ser que estivesse eu diante do Espelho de Ojesed. Os temores expostos na aula do professor Lupin mostram, porém, que os medos de um grupo de adolescentes podem beirar a futilidade. Enquanto Rony teme as aranhas e Simas Finnigan um espírito agourento, a Sra. Weasley perde a luta para o bicho-papão na casa dos Black, quando ele lhe mostra os corpos sem vida de pessoas que ela ama. Diante da guerra, a mãe de família mais amada pelos fãs teme justamente perder seus entes queridos. Dois anos antes desse episódio, na aula do professor Lupin, Voldemort não havia retornado às suas macabras atividades, logo, não havia iminência de guerra. Portanto, não só são diferentes os medos de jovens e pessoas de meia-idade, como também as circunstâncias podem alterar fatalmente os temores de alguém. Creio que, caso fossem questionados em seu sexto ano de escola, o maior medo de Harry Potter já não seria um dementador, e nem o de Rony Weasley, uma acromântula.

Harry, Hermione e Rony possuem, contudo, um diferencial formidável: eles não se recolhem à zona de conforto, e enfrentam seus medos cara a cara, por mais doloroso que isso seja. Rony relutou, pestanejou, mas entrou na Floresta Proibida com Harry, a fim de encontrar Aragogue, o rei das aranhas, e questionar-lhe quanto à culpa de Hagrid na abertura da Câmara Secreta. Harry, por mais que temesse os dementadores, vai à luta contra eles e busca, no auge de seus treze anos, uma forma de combatê-los. Saiu-se vitorioso em sua empreitada, como bem sabemos. Já mais maduro, Harry deixa para trás tudo o que lhe é importante e vai em busca das horcruxes de Voldemort. Para Hermione, a busca pelas horcruxes foi ainda mais dolorosa: ela enfeitiçou a memória de seus pais, para que se esquecessem completamente dela e mudassem de país, e fez isso exclusivamente para salvar-lhes a vida. Às favas com os medos! Nada melhor que uma boa dose de coragem para enfrentá-los, coragem esta que não faltou ao trio em momento algum.

Sabe-se perfeitamente bem o quão difícil é enfrentar um temor. Por vezes, é preciso que haja uma grande ajuda, mesmo psicológica, e não há nisso vergonha alguma. A sensação de vencer um medo, porém, é gloriosa. Há poucos sentimentos neste mundo que podem melhorar a sua autoestima mais do que vencer um velho e inútil temor. Em Harry Potter, todo esse processo está evidente, numa das muitas lições que J.K. Rowling nos passa nas entrelinhas. E você? Já enfrentou o seu bicho-papão hoje?

Não se esqueça da velha recomendação do Prof. Lupin: o feitiço Riddikulus precisa ser acompanhado de uma boa dose de riso.