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Diante do Espelho

O Espelho de Ojesed é um dos mais fascinantes objetos mágicos que surgem em toda a série Harry Potter. Quem nunca quis saber qual era o desejo mais profundo de seu próprio coração?

Como bem observa a nossa colunista Amanda Bomfim, é preciso um auto-conhecimento muito forte para saber qual é a sua vontade mais forte, justamente a que o Espelho de Ojesed lhe mostraria caso você estivesse frente a frente com ele. Não deixe de ler a coluna deste domingo é registrar seu comentário.

Por Amanda Bomfim

“Era um magnífico espelho, da altura do teto, com uma moldura de talha dourada, aprumado sobre dois pés em garra. Havia uma inscrição entalhada no alto: Oãça rocu esme ojesed osamo tso rueso ortso moãn.”

O Espelho de Ojesed. O Espelho do Desejo. Um dos objetos mais fascinantes que aparecem em toda saga, justamente pela simplicidade genial do que ele faz e representa. Qual de nós não gostaria de ver pelo menos um reflexo do desejo mais profundo e desesperado do nosso coração? Aposto que muitas pessoas se surpreenderiam com o que vissem refletido no Espelho de Ojesed. É preciso uma certeza muito grande sobre si mesmo para entender o próprio coração.

Quando Harry, um garoto de apenas onze anos que recentemente se descobriu bruxo, cheio de perspectivas e todo um caminho de possibilidades para trilhar, encontra o Espelho, é interessante o efeito que este causa nele. Imagino que nem o próprio Harry sabia o quanto sentia falta de ter uma família até vê-la ali, refletida, tão perto e ainda assim inalcançável como somente o passado consegue ser. O desejo existia, porém estava adormecido. Nada é tão doloroso quanto a possibilidade que se apresenta diante dos olhos, que se mantém ao alcance do olhar, porém, permanece inatingível. O quase-ter.

Sem dúvida, Harry logo entendeu que o que via não era real. “– Você acha que esse espelho mostra o futuro?” “– Como pode mostrar? A minha família está toda morta. Me deixa dar outra espiada.” Esse breve diálogo com Rony prova que Harry, ainda que talvez inconscientemente, sabia mais ou menos como funcionava o Espelho, mas ainda assim não conseguia resistir à tentação de continuar olhando. Vale destacar que é notável o quanto foi maior o efeito causado pelo Espelho em Harry que em Rony. Ainda que momentaneamente estupefato pela visão de si mesmo com mais glórias que todos os irmãos, Rony sentiu que o Espelho era perigoso. Rony não teve necessidade de voltar lá na noite seguinte. Talvez porque, ainda que improvável, a visão de Rony podia, sim, se tornar real. A de Harry, nunca. A própria consciência da impossibilidade do que desejava tornava a Harry tão difícil abrir mão do que via refletido, e do que sabia que só ali, no Espelho, poderia ver.

Quando Dumbledore aparece e explica a Harry a finalidade do Espelho, nosso querido diretor então diz, em minha opinião, uma das frases mais sábias da série: “Não faz bem viver sonhando e se esquecer de viver, lembre-se”. Certamente, Dumbledore colocou o Espelho ali para que Harry o encontrasse. Ele queria que Harry entendesse como funcionava o Espelho, e aprendesse com ele. Não apenas para saber como usá-lo quando mais tarde o encontrasse novamente, mas também para que aprendesse a conviver com o passado sem ser torturado pela agonia de querer torná-lo presente. É muito difícil controlar os desejos do próprio coração, mas é preciso deixar ir aqueles que não estão em nossas mãos tornar realidade. É preciso, assim como Harry, encará-los de frente, e então seguir a vida em busca de novas alegrias. O Espelho de Ojesed ensinou uma lição sutil, porém valiosa, que acompanhou Harry até o final da saga, e que, certamente, também deveria nos acompanhar ao longo de nossas vidas.

Amanda Bomfim deseja profundamente estar diante do Espelho de Ojesed.