J. K. Rowling ︎◆ Morte Súbita

Matéria traduzida do USA Today com J.K. Rowling

Está disponível mais uma matéria traduzida com a autora J.K. Rowling. Esta é a entrevista concedida ao jornal estadunidense diário USA Today, que foi publicada no site do veículo na véspera de lançamento do seu novo livro, o romance adulto The Casual Vacancy.

Entre tantas coisas, Rowling falou sobre como foi escrever a nova obra e também sobre o material liberado no Pottermore, projeto do qual ela sente um imenso prazer ao trabalhar. Ela registra ainda sua opinião sobre uma adaptação de The Casual Vacancy para os cinemas, fala sem muitos detalhes sobre seus próximos livros e conta como foi se apresentar para um público tão grande nos Jogos Olímpicos de Londres.

Você pode ler o artigo completamente traduzido, contendo spoilers (campos destacados), através deste link.

Aguarde por mais materiais traduzidos aqui no Ish como parte da cobertura de The Casual Vacancy.

THE CASUAL VACANCY
Exclusivo: JK Rowling leva carreira em nova direção

USA Today ~ Carol Memmott
26 de setembro de 2012
Tradução: Mari Trevisan
Revisão: Aline Michel

EDIMBURGO, ESCÓCIA – Com certeza, em algum lugar, na Escola de Magia e Bruxaria de Hogwarts há um livro de feitiços empoeirado e nunca notado. Nesse livro, J.K. Rowling, a aclamada criadora de Harry Potter, achou a fórmula que a transformaria numa escritora de ficção adulta elogiada pela crítica.

Mas Rowling não está contando com a magia enquanto a data de lançamento de seu romance adulto, The Casual Vacancy, chega perto. Ela acredita que sua reputação de criar ótimos personagens e histórias instigantes vai acabar com qualquer feitiço que Harry ou seu mentor, o todo-poderoso Professor Dumbledore, possam conjurar.

Em sua única entrevista para um jornal americano antes da publicação de The Casual Vacancy (Little, Brown, US$35) nesta quinta feira, Rowling, em uma entrevista na capital escocesa onde vive, compartilha com o USA Today o porquê de ter escrito o romance que leva sua carreira em uma nova direção, e a animação que ela sente com a proximidade de seu lançamento, cinco anos depois que o último livro Potter foi publicado.

“Claro que isso pode mudar amanhã, mas eu achei que ficaria mais nervosa porque já faz cinco anos – e esse é um tipo de livro muito diferente – mas na verdade me sinto animada’’, diz Rowling, que parece relaxada e confidente durante a entrevista neste mês, no escritório que ela mantém em uma das casas da era Georgiana desta cidade.

“Eu não acho que todo mundo vai gostar do livro,” diz ela. “Mas estou orgulhosa deste livro. Eu gosto dele. Ele é o que deveria ser. Como autora, não há muito mais a dizer sobre isso. Não quero ser arrogante, mas se as pessoas não gostarem, bem, é assim que deve ser, certo? Isto é arte. É tudo subjetivo. E eu posso conviver com isso.”

Em uma grande entrevista na qual ela falou sobre sua escrita, sua família, sua participação na abertura das Olimpíadas de Londres e seu testemunho no inquérito britânico sobre o escândalo de grampeamento de telefones da imprensa ocorrido no último outono, Rowling, 47, nos oferece um olhar íntimo em sua vida como uma das mais queridas autoras do mundo, cujos livros venderam 450 milhões de cópias ao redor do mundo (não há números disponíveis em vendas de e-book). Sua profunda imaginação sobre a vida e as aventuras de um menino bruxo, publicadas de 1997 a 2007, deram origem a parques de diversão, brinquedos, vídeo games, filmes de sucesso e Pottermore, seu fan-site para tudo de Harry Potter.

E porque a Pottermania está profundamente enraizada em nossa cultura pop, Rowling diz que entende e aceita que muitos leitores prefeririam que ela continuasse escrevendo sobre o menino bruxo.

“Sim, entendo esse ponto de vista. Se você ama uma coisa – e há coisas que amo – você quer mais e mais sobre isso, mas não é assim que se faz um bom trabalho. Então, como autora, escrevo o que preciso escrever. E eu precisava escrever este livro.”

Patricia Bostelman, a vice-presidente de marketing da Barnes & Noble, diz que The Casual Vacancy poderia ser o grande livro do ano. “Estamos muito otimistas em relação a esse livro. Ela é uma contadora de histórias talentosa e muito boa em criar personagens e mundos.”

Durante meses, detalhes do enredo de The Casual Vacancy foram escassos, e o livro foi embargado até que as vendas comecem na quinta, com apenas um seleto grupo de jornalistas tendo acesso a ele. Mas Rowling, em um dia ensolarado de outono em Edimburgo, fala sobre grandes detalhes sobre o enredo, os personagens e sobre como o livro foi feito. (O USA Today teve acesso ao romance).

Se Harry Potter veio a ela durante uma viagem de trem na Inglaterra, a ideia para The Casual Vacancy, diz ela, veio a cinco anos a bordo de um avião nos EUA no caminho para um evento de promoção de Harry Potter e as Relíquias da Morte, o sétimo e último livro da série que a tornou uma das autoras mais ricas do mundo.

“Não lembro como começou,” ela diz. “Apenas veio para mim. É difícil resumir a ideia, mas foi sobre uma eleição local que foi arruinada, e pude ver imediatamente que era um jeito perfeito de entrar em uma pequena comunidade, de examinar diversos personagens de várias idades. Esse tipo de livro me chama muita atenção. Eu gosto de me infiltrar em um grupo de pessoas e conhecê-las muito bem.”

No romance, a pequena (fictícia) vila britânica de Pagford é virada de cabeça para baixo depois da morte de um dos conselheiros paroquiais, Barry Fairbrother. Rowling usa sua morte como um modo de examinar a vida dentro do governo da vila, e mais importante, da vida dos moradores.

“Foi também uma ideia atraente porque vi que podia usá-la no tipo de cidade que eu conhecia,” Rowling diz. “Embora Pagford não seja Chepstow, a cidade onde cresci – é menor e a localização está errada – ainda assim é um lugar que conheço. É um lugar inventado, mas tem algo a ver com o West Country (sudoeste da Inglaterra), que é onde vivi a minha vida inteira até fazer 18 anos e sair de casa.”

A preparação para o lançamento do livro está sendo realmente moderada porque ela quis assim. “Na medida do possível, queria que essa fosse uma publicação normal. Um pouco do furor que envolvia uma publicação de Harry Potter era divertido. Eu sempre amei conhecer leitores. Sempre adorei fazer eventos onde posso falar com eles, mas alguns deles, honestamente, não foram divertidos”.

“A coisa criou vida própria. Uma parte era pura insanidade, e eu não podia controlar. Não podia pará-la. Não podia moderá-la. Por mais incrível que seja olhar para trás, nunca irei atrás disso de novo. Foi maravilhoso, mas também estressante, e era como um peso enorme de expectativa. Esse é um tipo muito diferente de livro, e estou muito feliz por simplesmente estarmos fazendo de modo diferente.”

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The Casual Vacancy nos mostra uma visão microscópica de várias famílias de Pagford, inclusive a de Krystal Weedon, uma adolescente meio incontrolável vivendo na pobreza com seu irmãozinho, Robbie, e sua mãe, Terri, que está se esforçando para superar seu vício em drogas.

“De algum modo, todo o enredo pode ser resumido ‘O que fazemos com Krystal?’ e por extensão, ‘O que fazemos com todas essas pessoas que estão presas na pobreza?’ Mas para Krystal, há mais do que isso, não há? ” Rowling diz. “Krystal está lidando com vício em sua família, está lidando com décadas de aumento da pobreza em sua família, com tudo que isso significa, e está também no fogo cruzado de uma batalha local porque esta linda cidade de Pagford do West Country está furiosa por ter uma jurisdição e responsabilidade por uma coisa que chamamos de council estate (zona residencial de baixa renda). Então Krystal está no meio dessa batalha local, e, claro, ao examinar essa pequena batalha local eu posso explorar o que eu acredito serem temas consideravelmente universais.”

Não é por acaso que a pobreza e problemas relacionados a ela são a questão fundamental do romance. “A família Weedon foi um modo de falar de coisas muito importantes para mim: pobreza, o que a pobreza significa em nossa sociedade, em um país ocidental prospero, as atitudes que são expostas em outras pessoas pela existência de tal família,” ela conta. Rowling, que já foi uma mãe solteira que dependia de ajuda do governo para cuidar de sua filha, criou um fundo de caridade que ajuda pessoas necessitadas.

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Devido aos temas sociais do livro, Michael Pietsch da Little, Brown, o editor americano de Rowling, disse ao USA TODAY em agosto que o romance “lembrou-me Dickens por causa da humanidade, do humor, das preocupações sociais os personagens intensamente reais”.

Rowling diz que está lisonjeada, mas “desconfortável se alguém achar que estou andando por aí me achando o novo Dickens. Acho que isso é presunçoso para qualquer um, mas eu tinha consciência do que queria que The Casual Vacancy fosse, quando comecei a escrever. Eu realmente queria que fosse como Trollope ou Dickens ou Sra. Gaskell no sentido que eu estou usando uma pequena comunidade, literalmente uma comunidade paroquial, e tentando analisá-la e anatomizá-la do jeito que eles fizeram. Eu realmente gosto desses romances do século dezenove. Este é o tipo de coisa que eu amo ler”.

Este é um romance bem britânico, mas Rowling não está preocupada sobre como será recebido fora do Reino Unido. “Acho que há uma possibilidade de que algumas pessoas não irão gostar do livro. É um livro muito inglês, e precisa ser assim, porque estou falando especificamente de uma sociedade que conheço muito bem.
“Eu acho que os temas tratados no livro passam por qualquer barreira nacional porque ultimamente estamos falando de nossa responsabilidade humana, não importa se você pensa que devemos ser totalmente autossuficientes e que devemos deixar as pessoas se virarem sozinhas, ou se você acredita que devemos ajudar uns aos outros e que isso deve vir do governo. Esses são temas contemporâneos em vários países, principalmente na bagunça financeira em que nos encontramos.”

Ela também está pronta para as críticas. “Escritores geralmente escrevem para serem publicados, então estou pronta, na medida do possível, para o que vier. Não publiquei com expectativas. Publiquei porque é isso que eu realmente queria escrever. Meu caminho na escrita não depende do que esperam ou dizem do meu trabalho. Vou simplesmente continuar seguindo meu caminho.”

Ela também não se importa se nunca houver um filme baseado no livro.

“Pessoalmente, eu não acho que seja um bom livro para virar filme. Essa é uma das coisas que gosto sobre ele. Acho que é um romance onde grande parte dos eventos acontece internamente. Você precisa entender o que está se passando na cabeça das pessoas. Embora aconteça muita coisa no romance, parte do que me agrada nele é que grande parte das coisas acontecem na vida interna das pessoas, e filme não é necessariamente o melhor meio de mostrar isso.”

É completamente o contrário da Pottermania que gerou oito filmes baseados nos sete romances Potter. Os filmes e os livros são as raízes do legado Potter, mas eles continuam vivos através de seu website, Pottemore, que ela diz ser um refúgio para ela.

O site é um meio de publicação dos e-books de Harry Potter. Por outro lado, é um lugar onde ela posta novas informações sobre o material que nunca foi mostrado nos livros. “É um bom retorno para os fãs, e é ótimo para mim também porque posso fazer de um modo tranquilo. Estou também gerenciando um novo material no site de graça, e adorei isso.” (Little, Brown publicará The Casual Vacancy como um e-book e uma edição em capa dura na quinta.)

Assim como é importante para Rowling controlar suas publicações, é ainda mais importante que ela tenha controle total sobre a cobertura da mídia, principalmente por causa de sua determinação em manter seus filhos longe dos holofotes. Rowling está casada com Neil Murray, um físico, desde 2001. Eles têm três filhos. Jessica, 19, de seu casamento anterior, agora é uma universitária. Seu filho, David, tem 9 anos e sua filha, Mackenzie, 7.

“Eu tento manter uma distinção entre minha vida profissional e a pessoal,” ela diz. “De um lado você quer ser honesto sobre a experiência de vida que orienta seu trabalho. Por outro lado, eu fiquei muito conhecida numa época em que a imprensa britânica nem sempre se comportou de um modo exemplar com pessoas como eu.” Ela está se referindo a incidentes onde ela e seus filhos foram fotografados sem sua permissão e seu endereço residencial foi impresso em jornais. “Não é que eu não queira me compartilhar, é simplesmente que eu tenho que decidir a melhor maneira de criar meus filhos.”

É por isso que ela aceitou um convite para testemunhar no escândalo de grampeamento de telefones da imprensa ocorrido último outono.

“Tive que pensar muito sobre fazer isso,” ela conta. “Você esta numa situação de paradoxo. Você esta lá, sentado, tentando explicar porque você gostaria de privacidade, e você está de certo modo invadindo sua própria privacidade para explicar. Então isso foi difícil, e houve coisas que eu não disse no estande porque algumas foram as piores experiências que tive em relação à mídia, e se tivesse feito isso, eu teria invadido a minha privacidade e a de minha família. Fui importante para o inquérito porque tenho tentado deixar minha família fora dos holofotes, e não tenho conseguido.”

Ela testemunhou sobre as várias vezes quando seus filhos foram fotografados sem sua permissão, sobre os jornalistas que acamparam a beira de sua porta e a vez em que um repórter deu um jeito de colocar um bilhete para ela dentro da mochila de escola de sua filha.

Enquanto isso, ela e sua família vivem normalmente em Edimburgo “dento de certos limites. Eu sou reconhecida, mas devo dizer que Edimburgo é uma cidade fantástica para se viver se você é conhecido. Há um respeito inato pela privacidade nas pessoas de Edimburgo, e também acho que eles estão acostumados a me ver andando por aí, então não acho que sou uma grande surpresa. O cidadão médio respeita muito o direito das pessoas de ir e vir e de fazer coisas como ir ao supermercado.”.

Uma de suas aparições públicas neste ano foi a participação na homenagem à literatura infantil durante a cerimônia de abertura das Olimpíadas de Verão em Londres. Enquanto assistia um ensaio, ela lembrou que “quando essa parte chegou e o grande Voldemort apareceu no meio do palco, aconteceu um desses momentos em que meu corpo fica totalmente frio e eu penso ‘Como diabos isso aconteceu?’ e estou olhando para esse Voldemort de 18 metros de altura ou o que quer que ele fosse e estava pensando, ‘Essa já foi uma ideia na minha cabeça, sobre a qual ninguém sabia.’ Foram algumas linhas escritas no verso de um envelope, e agora está representada no maior palco do mundo.”

Foi, ela diz, “o momento mais embaraçoso. Eu fiquei impressionada. Às vezes as coisas de Harry Potter viram um murmúrio. É parte da cultura o que é incrível, mas de vez em quando você tem esses momentos de ‘Oh meu Deus, como isso aconteceu?’ E este é definitivamente um deles”.

Rowling não vai dizer quando vai publicar novamente. “Não quero me comprometer. Eu estava simultaneamente devastada e liberada ao terminar os livros Potter. Eu estava realmente devastada – ‘Meu Deus, acabou, eu nunca mais vou escrever sobre Harry, Rony e Hermione,’ mas ao mesmo tempo havia uma grande sensação de liberdade então, egoisticamente, eu não quero prometer que vou produzir um livro daqui a um ano. Eu me sinto livre agora. Talvez essa sensação de liberdade signifique que eu vá escrever livros com mais frequência. Pode ser. Eu simplesmente não sei.”

E os fãs de Potter vão ter que lidar com o fato de que ela não está escrevendo nada para jovens adultos. “Não. Nada, nada, nada,” ela diz enfaticamente, “e seria um desafio por causa do que eu fiz com Harry. Não tenho planos de fazer isso agora, mas nunca diga nunca. Se eu tivesse uma ideia maravilhosa, provavelmente faria”.

Perto da conclusão, ela diz, é um livro para crianças. O leitor ideal teria 7 ou 8 anos. “Eu acho que a próxima coisa que vou publicar será para crianças, mas eu realmente não quero me prender a isso porque eu já sei qual vai ser meu próximo livro para adultos e eu adoro isso também, então depende. Sempre estive fazendo mais de uma coisa ao mesmo tempo.”