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Um é pouco, dois é bom, três é demais

Todos vão morrer. Mas que tal seria morrer três vezes? Essa interessante experiência aconteceu com Quincas Berro D’Água, um dos personagens do grande autor brasileiro Jorge Amado.
[meio-2]Debora Rezende apresenta o livro “A morte e a morte de Quincas Berro D’Água”, no qual um rapaz insatisfeito com a vida superficial, mesquinha e chata que levava, “se matou” e se jogou na noite. Até que morreu. Mas morreu mesmo? Leia o texto e deixe seu comentário!

“A morte e a morte de Quincas Berro D’Água”, de Jorge Amado

Um é pouco, dois é bom, três é demais Tempo: para ler de um tiro só no fim de semana
Um é pouco, dois é bom, três é demais Finalidade: para pensar e se divertir
Um é pouco, dois é bom, três é demais Restrição: não indicado para quem não gosta de pontos de vista alternativos
Um é pouco, dois é bom, três é demais Princípios ativos: bebida, Salvador, família, morte, sociedade.

Um é pouco, dois é bom, três é demais

Enfrentar a morte pode ser um desafio. Fazê-lo três vezes, definitivamente, é um desafio maior ainda. Em “A morte e a morte de Quincas Berro D’Água”, o renomado autor baiano Jorge Amado discute com o leitor não apenas questões póstumas: traz uma verdadeira enxurrada de críticas à instituição familiar e à vida em sociedade.

 

Um é pouco, dois é bom, três é demais

A história de Quincas começa no exato momento em que a personagem morre pela primeira vez: quando abandona sua respeitável família e o igualmente respeitável cargo público de Joaquim Soares da Cunha para se tornar um dos bêbados de maior renome de Salvador, Quincas Berro D’Água. Tal reviravolta é justificada pelo fato da opressão sofrida por Joaquim na vida familiar: a valorização do ter ao invés do ser, a pressão por um melhor posto social e a vida de aparências. Ao largar a família e se entregar a prostitutas e trôpegos, que aceitam e valorizam o protagonista por sua própria essência, Jorge concretiza a primeira e mais marcante crítica da obra.

No entanto, os problemas com a família não são a única fonte de perturbações da personagem. De fato, nem mesmo quando tem sua segunda morte, a morte física, Quincas encontra descanso. Enquanto sua família renegada tenta dar um fim discreto e moral ao homem que lhes causara tantos desgostos e problemas e os amigos em desespero profundo e real, Quincas se apresenta como um morte incomum: do tipo que bebe, fala e expressa emoções. Se tais reações são geradas pelas lembranças da família, dos amigos, ou da bebida, é um constante e cômico mistério da obra.

O fato de tentarem moldá-lo até mesmo em sua morte, com ternos caros, sapatos e cortes de cabelo, na tentativa de fazer o beberrão voltar à face respeitável de outrora, faz com que a personagem caminhe para sua terceira e definitiva morte: a morte que escolhe ter, da maneira que bem quisera, longe das amarras da família que sempre se preocupara mais com a aparência social do que com seu bem estar.

Pedida recentemente em vestibulares como a UNEB (Universidade Estadual da Bahia), a maneira leve com que a narrativa é feita faz com que o leitor, ao mesmo tempo em que reflete sobre as críticas apresentadas na obra, se divirta com a mesma.

Resenhado por Débora Rezende

112 páginas, Editora Companhia das Letras. Publicado em 2008.

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